domingo, 30 de abril de 2017

Debate Eutanásia (1) Eutanásia e Distanásia

Para qualquer assunto que queiramos debater e ter sobre ele uma posição, é indispensável ter claro o problema em causa e a definição dos conceitos que utilizamos. De outra forma, o nosso pensamento enreda-se, ou deixa-se enredar, e os debates deixam-nos insatisfeitos por sentirmos não terem contribuído para o nosso esclarecimento ou para uma maior consistência das nossas posições.
Debater a eutanásia corresponde a um desejo manifestado pelos nossos alunos. As publicações que aqui deixamos visam ser mais um contributo para o debate.

A Distinção entre os conceitos de "Eutanásia" e de "Distanásia"

1ª Abordagem pela etimologia - O termo "eutanásia" significa etimologicamente "boa morte", morte pacífica e sem sofrimento. O termo "distanásia" etimologicamente significa exatamente o contrário "má morte", morte difícil, 
2º Entendidos como prática - Neste sentido, a eutanásia refere-se a um ato, perpetrado pelo próprio ou por outro, em que se provoca a morte numa situação de sofrimento intenso, associado normalmente a doenças incuráveis, com o objetivo de obter um fim de vida menos doloroso. Também neste sentido, a distanásia, igualmente denominada "obstinação terapêutica" ou "encarniçamento terapêutico", consiste na utilização de meios terapêuticos desproporcionados perante uma situação de irreversibilidade e de morte inevitável, atrasando apenas esse momento.

As questões éticas e as tomadas de posição divergentes colocam-se principalmente relativamente à prática da eutanásia e às suas modalidades. Quanto à distanásia, podemos considerar a existência de relativo consenso, pois trata-se apenas de concordar em não prolongar artificialmente uma vida que já não tem quaisquer condições de se manter. Isso significa a aceitação da condição humana da mortalidade.

O problema da eutanásia pode ser equacionado como um problema que diz respeito à vida e à morte com dignidade. A dificuldade encontra-se assim, não apenas em definir os tipos de eutanásia mas em encontrar um consenso relativamente ao conceito de "vida com dignidade".

Devo ajudar os outros?


Imagem Reuters «Um homem ajuda um refugiado sírio que nada exausto em direção a uma prais na ilha grega de Lesbos». Disponível em  http://elcomercio.pe/mundo/actualidad/fotos-mas-impactantes-reuters-sobre-refugiados-noticia-1865502
DEVO AJUDAR OS OUTROS? Se tomarmos como referência a ética kantiana, para saber a resposta temos que nos fazer duas simples perguntas:
1) A ação de ajudar os outros pode ser universalizável? Quer dizer, válida não apenas para mim mas para todos os homens?
2) Quererei que a ação de ajudar os outros possa ser considerada uma lei da natureza?
Se responder afirmativamente, então a ação de ajudar os outros é uma ação moral. Em qualquer situação que se me depare, se tiver dúvidas, são só estas perguntas que tenho de fazer. Nada de obediência a regras, a prescrições, a credos morais impostos do exterior. Só tenho de pensar por mim mesmo, autonomamente, quer dizer, de modo exclusivamente racional. 

Sim, sim, é isso mesmo, só temos de utilizar a fórmula do imperativo categórico baseada na autonomia da vontade. 

Deixemo-vos com o texto de Kant:

 «Uma quarta pessoa ainda, que vive na prosperidade ao mesmo tempo que vê outros lutar com grandes dificuldades ( e aos quais ela poderia auxiliar), pensa: que é que isso me importa? Que cada qual seja feliz conforme a vontade dos Céus ou consoante consegue fazer por si; nada lhes tirarei nem os invejarei; mas contribuir para o seu bem-estar ou o seu socorro na desgraça, para isso é que eu não estou!
Ora supondo que tal maneira de pensar se transformava em lei universal da natureza, é verdade que o ser humano poderia subsistir, e sem dúvida melhor do que se cada qual se pusesse a palrar de compaixão e  benevolência e mesmo se esforçasse por praticar ocasionalmente estas virtudes, ao mesmo tempo que, se pudesse, se desse ao engano, vendendo os direitos dos outros ou prejudicando-os de qualquer outro modo. Mas, embora seja possível que uma lei universal da natureza possa subsistir segundo aquela máxima, não é contudo possível querer que um tal princípio valha por todo o lado como lei natural. Pois uma vontade que decidisse tal coisa entraria em contradição consigo mesma; podem com efeito descobrir-se muitos casos em que a pessoa em questão precise do amor e compaixão dos outros e em que ela, graças a tal lei natural nascida da sua própria vontade, roubaria a si mesma toda a esperança de auxílio que para si deseja.»

Immanuel Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785),




VI Olimpíadas da Filosofia



Realizou-se nos passados dias 20 e 21 de abril em Lagos, as VI Olimpíadas Nacionais da Filosofia, promovidas pela Prosofos, Associação Nacional para a Promoção da Filosofia.

Aqui está a prova:

retirado de https://www.facebook.com/prosofos/photos/pcb.1541773445857102/1541772255857221/?type=3&theater




As questões parecem-nos acessíveis e não duvidamos que, caso tivessemos tido condições para participar, os nossos alunos ter-se-iam sentido à vontade.
Será que é isso que os nossos alunos também pensam?

domingo, 23 de abril de 2017

Exame de Filosofia 2017- Informação Prova

A Prova Nacional de Filosofia realizar-se-á este ano a 19 de junho, pelas 14 horas.
Deixamos aqui os links do IAVE
a) informação-prova: http://provas.iave.pt/np4/file/163/IE_EX_Fil714_2017.pdf
b) histórico de exames/Banco de itens: http://bi.gave.min-edu.pt/exames/exames/eSecundario/750/?listProvas

BOM TRABALHO!!!

Dia Mundial do Livro 2017


O Dia Mundial do Livro em Portugal é comemorado a par dos 150 anos da abolição da pena de morte em Portugal.





Cartaz de Cristina Sampaio


«​O Dia Mundial do Livro é comemorado, desde 1996 e por decisão da UNESCO, a 23 de Abril. Este ano associa-se aos 150 Anos da Abolição da Pena de Morte em Portugal.
Esta data foi escolhida com base na tradição catalã segundo a qual, neste dia, os cavaleiros oferecem às suas damas uma rosa vermelha de S. Jorge, e recebem em troca um livro, testemunho das aventuras do heroico cavaleiro. Em simultâneo, é prestada homenagem à obra de grandes escritores, como Shakespeare e Cervantes, falecidos em abril de 1616.

Em 2017, e porque se comemoram os 150 Anos da Abolição da Pena de Morte em Portugal http://150anosdaabolicaodapenademorteemportugal.dglab.gov.pt/, a Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas quis relacionar o Dia Mundial do Livro com esta efeméride, incitando à leitura e celebrando o livro como um hino à vida.

O cartaz, um cartoon com conceção e design da ilustradora e cartoonista Cristina Sampaio http://www.cristinasampaio.com/pt/, pretende mostrar simbolicamente que o livro e a leitura são fatores fundamentais para o crescimento económico, político, social e cultural, e que se encontram na base da cidadania plena.»

Cartaz e texto retirados daqui: http://www.dglb.pt/sites/DGLB/Portugues/noticiasEventos/Paginas/DIA-MUNDIAL-DO-LIVRO-2017.aspx

domingo, 2 de abril de 2017

Doze Homens em Fúria


Neste 2º Período despedimo-nos dos alunos do 11º ano com o visionamento deste extraordinário filme de David Lumet. Tinha sido pensado, inicialmente, para fechar o tema da Argumentação, mas não chegou a ser possível. Ficou prometido. Agora, já com conhecimentos de Descartes, o filme ganhou maior riqueza. Então não é que com Descartes tão próximo é a importância da dúvida que ressalta em primeiro lugar? Como disse a S., o que nós encontramos aqui é o «crivo da dúvida» como forma de chegar à certeza ou, pelo menos, de fazer o exame crítico das nossas opiniões. Não que a argumentação não tivesse tido relevância. Mas apareceu também à luz da sua ligação com a racionalidade, com o próprio processo de funcionamento da racionalidade humana e não como simples processo de defesa de uma determinada tese. De qualquer modo, pensar é saber não apenas o que se pensa, mas que razões sustentam esse conteúdo de pensamento.

«Você é como toda a gente. Se pensar de mais fica baralhado.»

Pois. Pensar, às vezes, desconcerta. Porque nos faz perder muitas das crenças que tomamos como certas. Perdê-las é aceitar que estavamos errados. E ninguém gosta disso. Somos feitos para a segurança e para a certeza. Mas como diz a filósofa Hanna Arendt «pensar é perigoso, mas não pensar é mais perigoso ainda»... 



O que gostaria era que os meus alunos, que tiveram intervenções tão pertinentes em aula, venham agora aqui deixá-las por escrito...

Será que é desejar muito???



terça-feira, 14 de março de 2017

Duvidar, até onde?



Neo (personagem do conhecido filme Matrix) encontra Descartes. Encontro improvável? Nem por isso. 

E se tudo o que vemos, pensamos e acreditamos ser a realidade não for mais do que uma ilusão, um enorme embuste?
E se nós próprios não somos senão a invenção de uma mente perversa, de um grande génio maligno?
E se não formos senão um cérebro estimulado para produzir todo o conjunto de representações que povoam a nossa mente?
E se admitirmos essas possibilidades temos condições para encontrar uma resposta?
Temos. O ceticismo é um caminho com fim à vista. Não somos uma ilusão, não somos um embuste, não estamos condenados à aparência e ao erro. Mas o caminho que conduz à verdade não nos é oferecido. É difícil e não devemos desistir com os obstáculos. Essa é a posição de Descartes. E de Neo.

Este video apresenta com clareza e com humor as razões e as características da  dúvida de Descartes, estabelecendo uma comparação com o filme Matrix.




Duvidar, até onde?



«Porque os nossos sentidos por vezes nos enganam, quis supor que não existia nada que fosse tal como eles no-lo fazem imaginar» (Descartes, Discurso do Método, quarta parte) 
Sim, Descartes, quanto aos sentidos, estamos convencidos. Os céticos também já tinham sido muito persuasivos...

Mas duvidar de que temos um corpo, duvidar não só do mundo tal como o vemos, mas do próprio mundo como realidade exterior a nós? Admitir até que 2+2 possam não ser 4? Admitir a possibilidade que tudo o que tomamos como certo possa ser apenas uma gigantesca ilusão? 
Duvidar de estar aqui, nesta sala, com estes alunos, a falar de ti??? 
Como é que isso se justifica? 

Talvez o filósofo  Nigel Warburton nos consiga persuadir que sim, que Descartes tinha razões para duvidar e que nós também!

Voltamos de novo a este video tão apelativo! (conf. post de 11 de março 2015; sob a etiqueta «Descartes»)





domingo, 12 de março de 2017

Pensar é perigoso e não pensar é mais perigoso ainda...


Influenciado pela reflexão sobre o mal de Hanna Arendt, o psicólogo S. Milgram concebeu uma situação experimental, que concretizou entre 1961 e 1963, com a qual testa até onde podem ir os comportamentos de obediência...


Em 2015 estreou-se nos E.U.A. (entre nós, em 2016) o filme «Experimenter», de M. Almereyda, que conta com Peter Sarsgaard e Winona Ryder nos principais papéis. O filme é praticamente uma biografia relatando a vida pessoal e académica de Milgram e, naturalmente, esta importante experiência.



Resultado de imagem para experimenter
Imagem retirada de: http://cinecartaz.publico.pt/Filme/362657_experimenter




Stanley Milgram foi influenciado pelos terríveis acontecimentos da Segunda Guerra Mundial e, particularmente, pela cobertura jornalística que a filósofa Hannah Arendt fez do julgamento do nazi Eichmann, em Jerusalém, durante o ano de 1961. Arendt desenvolve aí o conceito de «banalidade do mal», através do qual explica como indivíduos normais, em determinadas contextos, podem praticar atos desumanos e criminosos que individualmente e noutras situações não praticariam. Obedecer a ordens, obedecer simplesmente a ordens, essa teria sido a única culpa que Eichmann admite.


Milgram concebe uma situação experimental através da qual possa explicar os comportamentos de obediência. 
Os sujeitos participantes desempenhavam o papel do «professor» que castigava o «aluno» a cada resposta errada com choques elétricos progressivamente mais fortes à medida que o número de respostas erradas aumentava (sem saberem que o «aluno» não estava, na realidade, a receber qualquer choque). 

Os resultados obtidos foram surpreendentes, até para Milgram, visto que cerca de 65% dos participantes na experiência (voluntária e com remuneração pouco significativa) chegaram a infligir choques elétricos de 450 volts (suscetíveis de provocar a morte). Apesar de poderem desistir a qualquer momento, apesar de o fator remuneração ser desprezível, só cerca de 30% abandonaram a experiência.

Esta semana, os alunos de Psicologia do 12º ano puderam ver este video trazido pela M. B. e pela B.O.

I


Indivíduos normais (e não especialmente perversos ou cruéis) são capazes de praticar atos em que infligem danos a outrem (até mesmo a própria morte), desde que estejam numa situação em que considerem ter de obedecer, em que estejam submetidos a uma autoridade, em que sintam diminuição ou desaparecimento da noção de responsabilidade pessoal. Hanna Arendt diria, em que não pensem por si próprios.

Reproduções da experiência de Milgram já foram levadas a cabo com resultados similares. Em 2009 foi feita uma experiência por jornalistas que deu origem ao documentário Le jeu de la mort (2010) numa coprodução da  France Télévisions e da Radiotélévision Suisse, com resultados que continuam a dar que pensar.

Mas isso fica para outro post...



quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Vamos fazer um debate? (1)

imagem retirada de http://www.imagenslivres.com/troca-de-ideias-debate/




       Os nossos alunos manifestam com muita frequência a vontade de "debater". No entanto, depressa nos damos conta de que o seu entendimento de debate é frequentemente limitado à ideia de que se trata de uma maneira de expressar e defender uma qualquer opinião sem a preocupação de ouvir outras ou de clarificar sequer o assunto acerca do qual se pretende "ter opinião". Seguramente, é aqui que entra o nosso trabalho: conduzi-los à clarificação e aprofundamento das suas ideias, desenvolver a capacidade de ouvir e de reformular o seu pensamento, frequentemente pouco claro e insuficientemente sustentado, fazê-los sentir a necessidade da informação e do conhecimento sem o qual não existe pensamento estruturado e consistente, em suma, desenvolver um pensamento crítico. Não é tarefa fácil!!!

Antes de nos lançarmos à água, talvez seja bom clarificar o que entendemos por debate no contexto de sala de aula. Socorremo-nos deste texto retirado daquihttp://www.texto.pt/pt/dicas/detalhes.php?sec=7&id=41, acesso a 11 jan. 2017


Como organizar um debate

O debate é uma actividade que decorre naturalmente da vida em sociedade e que nos permite a troca de ideias, o confronto de pontos de vista e a reflexão. Além disso, a informação aumenta, aprende-se a tomar a palavra, a demonstrar e a convencer.
Para que o debate corra bem convém definir:

1. O papel de cada um dos intervenientes 

Um debate é uma troca activa, em que se recebe, ouvindo atentamente os outros, e em que se dá, exprimindo as nossas convicções sobre os temas em discussão. Para tal, é preciso:
  • Saber ouvir
Cada um tem direito à expressão. Não se deve ironizar nem cortar a palavra. Mesmo que não se partilhe da opinião expressa, deve-se respeitá-la e ouvir atentamente o que os outros têm para dizer. Ouvir bem é pensar no que o outro diz.
  • "Praticar" a expressão oral
Não se aproveita o debate se não se estiver resolvido a tomar a palavra. Esta é uma boa ocasião para se vencer a timidez. O que é preciso é exercitar cada vez mais.

Exprimir-se é expor o ponto de vista sobre cada um dos pontos abordados, pelo que deve indicar-se com nitidez a posição que se tem, tendo o cuidado de apoiar cada afirmação com um ou vários documentos/provas.

O valor de um debate reside no valor dos argumentos. Devem procurar-se, pois, provas para convencer os outros. Não se deve ter receio de mudar de opinião no decorrer do mesmo se descobrirmos que o ponto de vista defendido não é válido. Tal atitude é prova de honestidade e de coragem.

2. As etapas para a organização e realização de um debate

  • Escolher um assunto simples e que desperte interesse.

  • Na maioria das vezes, o debate ganha em animação e interesse se tiver sido preparado previamente por quem o organiza, quer a a nível da informação fornecida/adquirida quer pensando sobre o tema em questão. Para o conseguir:
- pode fazer-se um inquérito, reflectir sobre um pequeno questionário.
- estudar/criar um dossier sobre o tema, após reunir documentação sobre o mesmo.
- um grupo pode preparar uma exposição de cerca de 10 minutos que servirá de ponto de partida. Esta exposição pode assumir a forma de uma pequena representação teatral, de um pequeno filme ou uma apresentação em Power Point.


  • O debate deve ser organizado materialmente, ou seja, há que pensar sobre:
- Como se vai dispor a sala?
- Quem vai animar/moderar o debate?

  • O que faz o(a) animador(a)/moderador(a):
- lança o debate, expondo com clareza o assunto a discutir;
- dá a palavra às pessoas que a pedem e impede que a outras intervenham sem a ter pedido;
- estimula os participantes e convida-os a reagir e a exprimirem-se;
- chama a atenção para o assunto que está a ser debatido quando as intervenções dos participantes "fogem" ao mesmo;
- controla o tempo e, no fim, convida a que tirem conclusões.
Durante o debate, dois secretários tomam notas das principais ideias emitidas que permitirão fazer o balanço final.
Este conteúdo foi gentilmente cedido pelo Centro de Competência Nónio da Malha Atlântica(com ligeiras adaptações).