domingo, 12 de julho de 2020

Exame de Filosofia 2020 - Prova e Critérios Gerais de Classificação

No passado dia 8 de julho, pelas 9:30, realizou-se o Exame Nacional de Filosofia (714).
Alguns alunos da nossa escola optaram por este exame, ou para acesso ao Ensino Superior ou para conclusão do Ensino Secundário. Esperamos que tenham conseguido uma prestação ao nível do seu trabalho e merecimento, numa prova que pode ser considerada atípica, tal como foi o ano letivo que acaba de chegar ao fim...

Imagem retirada daqui: https://postal.pt/sociedade/2020-07-06-Exames-nacionais-Quase-42-mil-alunos-fazem-prova-de-Portugues


Deixamos aqui os links de acesso à prova, versões 1 e 2, e aos respetivos critérios gerais de classificação.

Versão 1
http://www.iave.pt/images/arquivo_de_provas/2020/714/EX-Fil714-F1-2020-V1_net.pdf

Versão 2
http://www.iave.pt/images/arquivo_de_provas/2020/714/EX-Fil714-F1-2020-V2_net.pdf

Critérios gerais de classificação
http://www.iave.pt/images/arquivo_de_provas/2020/714/EX-Fil714-F1-2020-CC-VT_net.pdf

E se Descartes estiver errado?


Este texto é da responsabilidade da aluna L.M do 11ºano, turma A. Por razões de melhor legibilidade, selecionou-se o excerto considerado mais significativo para dar relevância à posição crítica da autora relativamente à filosofia cartesiana.

Ao duvidar de tudo consigo perceber uma coisa: estou a pensar e para pensar preciso de existir, se penso pelo menos eu existo como substância pensante. Esta afirmação vai ser a base para todas as certezas. Vai ser o alicerce do sistema do saber. O cogito ao ser descoberto por intuição e de natureza puramente racional e que dependeu unicamente da razão, é uma afirmação evidente e indubitável com uma certeza inabalável e é a 1ª certeza de que podemos ter. Assim fornece-nos o critério de verdade que é a clareza e a distinção das ideias, ou seja, tudo o que concebemos muito claro e distintamente é verdadeiro. 
O cogito por ter natureza de puro pensamento é independente em relação ao corpo, por isso é mais acessível e é anterior ao conhecimento das coisas corpóreas. 
Só de uma coisa tenho a certeza (de que existo), então será que existe algo para além de mim? Como não posso recorrer aos sentidos, pois já os recusei no início, tenho de recorrer a mim mesmo e procurar na minha mente. Com isto concluo que existem diferentes tipos de ideias: as que “vieram comigo” (as ideias inatas); outras que vieram de fora (as ideias adventícias) e as que foram inventadas por mim (as factícias). Ao examinarmos as ideias inatas descobrimos que o homem é um ser imperfeito que não pode criar só por si a ideia da perfeição, esta ideia é inata e só pode ter origem no próprio Deus que a colocou na nossa mente. Esta ideia faz-nos conceber Deus como um ser perfeito, incapaz de nos enganar pois enganar é imperfeito. Assim para além do cogito, passamos a admitir a existência de Deus e do mundo. 
Em conclusão ao duvidar de tudo só consigo ter a certeza de uma coisa: eu duvido e se duvido, eu existo e com isto conseguimos comprovar a existência de mundo e de Deus. 
O cogito parece extremamente seguro e inabalável, mas e se estivesse errado? 
Começamos pelo facto de ele dizer que é uma crença básica quando dizemos “Penso, logo existo” estamos a compreender e a descodificar várias ideias. Será que a verdade dessa ideia seria tão evidente se não conhecêssemos anteriormente a verdade de outras ideias? Ou seja, o cogito deriva de uma inferência, de um raciocínio, um conhecimento derivado, por isso não é uma crença básica, pois esta tem e ser conhecida diretamente, sem inferência. 
De seguida, Descartes afirma que Deus é a garantia de verdade do que conhecemos evidentemente, mas ao mesmo tempo usa a clareza e a distinção para provar Deus, comete uma falácia da petição de princípio. Assim a filosofia de Descartes cai por base. 
Passando à frente, a filosofia de Descartes começa pela dúvida num alcance universal estendendo-se tanto às crenças como às nossas faculdades racionais. Em primeiro lugar o ceticismo extremo é impossível pois está para além do que o ser humano consegue fazer. Mas mesmo que conseguíssemos não conseguíamos ir para além dela sem usar as faculdades racionais (que já pusemos em dúvida). Ou seja, se a dúvida fosse praticável seria inultrapassável. 
No projeto de Descartes a existência de cogito é fundamental. No entanto não podemos ter nenhuma ideia do eu. Todas as nossas ideias têm origem em impressões, mas nenhuma impressão tem origem na ideia “eu”. Tudo o que vemos quando olhamos para nós são uma sucessão de perceções particulares. Por isso o cogito é apenas uma ficção e não pode ter o papel essencial de Descartes lhe dá. 
Por fim Descartes prova a existência de do mundo exterior com o facto de argumentar que as ideias cuja causa atribuímos com a objetos físicos têm, de facto, essa causa. Mas segundo a objeção nós só temos experiência direta das representações na nossa mente, não dos objetos físicos, assim não podemos ter a relação entre as nossas representações mentais e os objetos que elas copiam. Deste modo não podemos afirmar que os objetos físicos são a causa das nossas perceções e portanto não existem objetos físicos. 
Assim o projeto de Descartes é condenado ao fracasso. 


Somos escravos?


Este texto é da responsabilidade do aluno P. M. do 11º ano, turma A, que o realizou livremente, respondendo ao desafio que lhe foi lançado numa aula de Filosofia (ou teria sido no final de uma aula de Filosofia?). Por tantos afazeres, este texto, entregue ainda no 1º período, só agora é publicado. Pelo facto, se pede desculpa ao autor. O título é da nossa responsabilidade e espero que o autor não discorde dele. 

Durante as minhas últimas reflexões eu vim-me a aperceber de algo: nós somos escravos. Não, eu não vim aqui falar de questões de livre arbítrio nem nada do género. Eu venho aqui falar de outros assuntos. Quando usar o termo “escravo” não me vou referir apenas ao facto de as acções de um determinado indivíduo serem constrangidas por algo, mas também irei aqui mencionar o opressor do indivíduo.
Então, para começar, vou mencionar as diferentes opressões a que estamos sujeitos. Nós, seres humanos, somos escravos de três coisas:
1. Nós somos escravos da natureza;
2. Nós somos escravos da sociedade;
3. Nós, por mais peculiar que pareça, somos escravos de nós mesmos.
Comecemos, naturalmente, pelo princípio. Nós somos escravos da Natureza, das Leis da Física. Suponho que não existe ninguém que esteja a ler este texto que não concorde com este juízo. Afinal, todos nós estamos sujeitos à acção do tempo, da gravidade, do nosso próprio genoma, entre outras coisas. Por muito que quisesse (e, em última análise, por muito proveitoso que pudesse ser), nenhum de nós poderia parar o tempo, voar pelos próprios meios ou não dormir nunca. Não sei o que nos reserva o futuro, porém, acho que o único local onde alguma vez seremos livres das Leis da Física será na nossa imaginação.
Está bem, nunca seremos livres do primeiro opressor mas, e então o segundo? Nós somos escravos da sociedade que construímos e em que vivemos. Questionem-se: no que consistem os vossos dias? Bem... - dirão vocês - eu acordo, tomo o pequeno-almoço, vou para a escola, volta para casa, faço os TPCs, tomo banho, lavo os dentes e volto a dormir. Quanto tempo é que têm livre? Pouco... - dirão. E se nós estivermos atentos veremos que a vida adulta não é muito melhor, pelo contrário. O único tempo livre que temos durante o tempo escolar é, por norma, apenas o fim-de-semana (ou nem isso naquelas vezes em que a professora de matemática nos envia 11 exercícios para fazer para segunda-feira). Então, esperamos sempre que a semana acabe e que chegue o tão apreciado fim-de-semana. Meus caros colegas: isso não é forma de se viver. Isto tudo para dizer o quê? Que é a rotina, sim, aquela rotina chata e monótona que nos enche a vida e que faz com que nós fiquemos cansados de tudo isto. É ela que nos oprime. Mas não só, também é o sistema com que a nossa sociedade se organiza, quer seja o sistema político, injustiças sociais ou outras tais futilidades. Então, que se pode fazer para mudar a sociedade? Como é que nós podemos ser iguais à Finlândia, onde os estudantes só têm aulas de manhã para puderem passar mais tempo de qualidade com as suas famílias e desfrutarem da vida, ou à Suécia ou à Noruega, essas utopias nórdicas? Bem, a sociedade é difícil de mudar mas, se cada um fizer a sua parte e for perseverante no que toca ao assunto, talvez ela mude, um dia. Até la, resta-nos tentar aproveitar bem a vida que temos pois, verdade seja dita, ela podia ser bem pior.
Por fim, abordemos o último tópico, algo que é, de certa forma, vergonhoso e estranho simultaneamente. Pior que ser um escravo é ser um escravo de mim mesmo. E como é que tal coisa pode ser possível? Fácil: cedendo aos nossos vícios. Nós, quando sofremos de adicção e nos custa largar aquele prisma de lítio e silício, que nos capta a atenção com toda aquela luz, ou quando estamos viciados, como acontece com alguns, em tabaco ou drogas, e, apesar de querermos largar aquilo acabamos por ceder àquela tentação só porque ela nos alegra a vida. Ou ainda, como acontece com os obsessivo-compulsivos, que se sentem tão desconfortáveis se não fizerem aquilo que os deixa ainda mais desconfortáveis... (Pois... mas isso já é uma perturbação mental um quanto difícil de explicar por isso fiquemos pelos primeiros dois exemplos.). Eu próprio admito que muitas vezes sofro de adicção. Eu podia estar a fazer coisas muito mais interessantes do que estar a ver vídeos idiotas ou a jogar um jogo da treta no telemóvel. Coisas que ajudassem no meu desenvolvimento pessoal (dedicar-me mais à escrita, à leitura, etc.). Às vezes penso: “está bem, hoje vou começar a ler um livro”. Cinco segundos depois olho para o ecrã do telemóvel e fico por lá.
Agora, analisemos outro exemplo. Um indivíduo viciado em nicotina ou noutra droga qualquer, que quer deixar o seu vício e recomeçar a sua vida a partir daí, mas que não consegue. Porque o indivíduo já se curvou tanto perante o seu vício que já não se consegue levantar. Porque é só desta vez, é só mais uma vez, porque a vida não está a correr bem ou por outra razão qualquer.
E assim, cada um de nós se escraviza a si mesmo. Se bem que a pergunta que deve estar nas vossas cabeças agora deva ser “e é possível libertar-me dessas correntes?”. Para ser franco, não tenho certeza de que isso seja possível para todos os casos ainda que eu goste de pensar que sim. A solução é, a meu ver, sintetizada em três palavras, força de vontade. Analisa cuidadosamente os teus hábitos diários, se descobrires que possuis algum vício, que te está a moldar negativamente, recorre ao teu poder de iniciativa e tenta acabar com ele deixando-o simplesmente para trás ou entretendo-te com outras coisas que te distraiam daquilo, hábitos mais saudáveis. Caso ele persista procura ajuda especializada (sim, eu estou a falar de um psicólogo caso seja necessário, e antes que pensem em alguma coisa só há que ter vergonha de não ter coragem de admitir que se tem um problema). É assim que, recorrendo à nossa força de vontade, nos podemos libertar de todas as nossas inibições e começar a viver as nossas vidas.
Podemos não nos conseguir libertar das Leis da Física pois elas só dependem do Universo; podemos não nos conseguir libertar da rotina da nossa vida profissional já que isso implicaria mudanças extravagantes na nossa sociedade actual; mas podemos libertar-nos dos nossos vícios pois esses só dependem de nós. O importante é nunca desistir de tentar.
Obrigado por estarem a ler este texto enquanto vocês podiam estar a fazer outra coisa qualquer. Caso não estejam a ler este texto, deviam estar.

Igualdade e Discriminação


Este texto é da responsabilidade do aluno J.M. do 10ºB. 


No âmbito da disciplina de Filosofia do 10º ano, a professora Paula Bandeira propôs a realização deste trabalho, sobre o tema "Igualdade e Discriminação".
Primeiramente, apresentarei os conceitos de Igualdade e de Discriminação, bem como os principais tipos de Discriminação.
Posteriormente, passarei a uma reflexão subordinada ao tema proposto.


Como base deste trabalho, é necessário partir das definições de Igualdade e Discriminação.
Por ser tão fácil de partilhar informação online, quando fazemos uma pesquisa relacionada com este tópico, encontramos inúmeros websites que apresentam definições parecidas, mas distintas, o que dificulta a escolha da definição que devemos aceitar.
Por este motivo, decidi citar dois documentos basilares da sociedade em que vivemos: a Constituição da República Portuguesa e a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

"Princípio da igualdade
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual"
Artigo 13º da Constituição da República Portuguesa

"Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade."
Artigo 1º da Declaração Internacional dos Direitos Humanos
"Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania."
Artigo 2º da Declaração Internacional dos Direitos Humanos

Ambos os documentos apresentam noções semelhantes do conceito de Igualdade:
Em suma, Igualdade é o valor que visa garantir que todos os cidadãos têm os mesmos direitos, deveres, acesso a bens, oportunidades e recursos sociais, independentemente da sua riqueza, sexualidade, posição social, sexo, cor da pele, raça, religião, inclinações políticas ou qualquer outra condição.
Além disso, é necessário acrescentar, tal como referido pela professora em aula, que a Igualdade não consiste em investir numa sociedade cujos membros são todos semelhantes, com os mesmos traços físicos ou psicológicos. A Igualdade é a procura de uma comunidade cujos membros tenham igual dignidade e, portanto, iguais direitos, deveres e oportunidades.

A partir da definição de Igualdade, podemos facilmente perceber o que é a Discriminação: é o fenómeno em que algum cidadão ou grupo, por questões de raça, cor da pele, sexo, sexualidade ou outro dos motivos referidos anteriormente, é privado dos seus direitos ou recursos ou isento de deveres, sem que o mesmo aconteça com os restantes membros da sua comunidade. Tal situação leva a que esse cidadão não esteja em Igualdade em relação aos outros.
Então, podemos concluir que a Discriminação é fonte de Desigualdade numa sociedade.

Alguns dos tipos mais referidos de Discriminação são Racismo, Xenofobia, Homofobia, Sexismo e Discriminação Religiosa.
Há, no entanto, várias formas de discriminar grupos ou pessoas que, apesar de não serem tão comuns ou conhecidos, são igualmente relevantes e errados.
São exemplos disto o Idadismo (termo recente, que surgiu com o fenómeno generalizado de envelhecimento da população), que consiste na Discriminação dos membros mais velhos da sociedade; Discriminação por fortuna, ou pobreza e Discriminação de cidadãos por estado de incapacidade física ou mental.
  
Numa sociedade moderna, é, a meu ver, inaceitável que possa haver situações de Discriminação.
Assim, devem ser adotadas estratégias que garantam a Igualdade de direitos, deveres, recursos e oportunidades a todos os membros de uma comunidade.
Para tal fim, há duas abordagens possíveis, que são, na verdade, complementares.

A primeira forma de abordar esta questão é mais geral e consiste na garantia da Igualdade "por defeito" a todos os cidadãos.
Contudo, porque existem situações específicas que criam fragilidades em certos grupos, tendo a sociedade a obrigação de proteger os mais fracos, por vezes é necessária uma segunda abordagem, mais "corretiva", que visa compensar essas desigualdades.

Considere-se o exemplo da Acessibilidade Universal no espaço.
Numa situação ideal, todos os espaços públicos, equipamentos, transportes e edifícios seriam acessíveis a todos os cidadãos, em qualquer situação e altura da vida.

No entanto, a realidade demonstra-nos que existem situações não ideais, em que é necessário tomar medidas para garantir essa mesma Acessibilidade. Em certos casos, é necessário instalar passadiços, rampas, elevadores ou outras estruturas para nos certificarmos de que qualquer cidadão que assim o entenda, independentemente das suas condições de saúde ou idade, possa usufruir de tais recursos.

As medidas compensatórias para defesa dos mais fracos devem ser aplicadas de forma criteriosa e excecional, apenas em casos que, de facto, as justifiquem. Caso contrário, estas medidas poderão vir a intensificar o mesmo mal que pretendem corrigir ou até criar outras situações de injustiça.

Um exemplo da forma como, quando excessiva, a proteção de determinado grupo contra a Discriminação pode ter efeitos negativos, é a criação de quotas de postos de trabalhos destinados exclusivamente a um certo grupo.
Numa tentativa de promover a Igualdade numa comunidade, é frequente as entidades empregadoras reservarem determinado número de postos de trabalho para grupos frequentemente discriminados.
Esta é uma atitude que parte de bons princípios: tem o objetivo de encaminhar a população para a Igualdade.
No entanto, apesar de surgir de uma boa intenção, a criação de quotas para determinado grupo pode ter efeitos perversos e negativos, acabando por acentuar ainda mais a Discriminação que pretende combater.

Apesar da boa intenção subjacente, a criação de quotas pode levar a que certas pessoas acedam a cargos, não por mérito, mas para preencher um lugar reservado para o seu grupo, o que pode acabar - em vez de proteger um grupo numa situação de fraqueza - a causar: por um lado, uma desmotivação por parte dos cidadãos em questão (que nunca têm a certeza se alcançam os seus objetivos por mérito, ou apenas porque estão a ser protegidos), por outro lado, pode levar a que se reforce na sociedade a ideia de que esse grupo é inferior ao resto, dando-se um fenómeno de "Discriminação em sentido inverso".

É também necessário refletir sobre o efeito que terá o excessivo mediatismo dado a determinadas situações de Discriminação.
Alertar a população para este tipo de cenário tem um impacto positivo e importante na sociedade.
Contudo, quando se enfatizam demasiado estes acontecimentos, o efeito pode, a meu ver, passar a ser o contrário.
O excesso de exposição de uma sociedade a este tipo de temáticas acaba por acentuar a Discriminação, uma vez que cria na sociedade a noção de que os cidadãos que se enquadram no grupo discriminado são, de alguma forma, inferiores  ao resto da comunidade, em oposição à realidade: todos os membros de uma comunidade têm igual dignidade.
Desta forma, inicia-se um fenómeno, a Condescendência, em que a parte da comunidade que se sente em vantagem, tende a tratar a parte mais fraca de forma diferente da que trataria alguém do seu próprio grupo: o grupo não-discriminado, mesmo de forma inconsciente, tende a "proteger" o grupo discriminado.
Assim, na minha opinião, os media têm um papel importante na prevenção da Discriminação, mas, no entanto, quando levada ao extremo, essa mesma sensibilização acaba por se tornar fonte de mais Discriminação e afasta uma sociedade da pretendida Igualdade.


Em suma, o objetivo numa sociedade é, a meu ver, garantir a Igualdade de todos os cidadãos.
"Por defeito", todos os membros de uma comunidade devem então ter os mesmos deveres, direitos e oportunidades.
Para atingir esse objetivo, são necessárias estratégias de combate à Discriminação - que é, afinal, um agente de Desigualdade.
A realidade mostra que, por vezes, é essencial tomar medidas mais específicas, que têm como finalidade compensar situações de Desigualdade.
Não obstante, sempre que se tenta proteger um grupo mais fraco, é crucial fazê-lo de forma a não aumentar as assimetrias já existentes nem criar fontes de Injustiça.


terça-feira, 16 de junho de 2020

Visitas de Estudo para quê?

O conhecimento contribui decisivamente para nos desenvolvermos como pessoas e como cidadãos a fim de podermos ter um contributo ativo na sociedade, no mundo do trabalho e nas múltiplas dimensões da vida, pessoal, cívica, política... É pelo conhecimento, nomeadamente da História, do mundo que já existia antes de nós, nos mais diversos aspetos, que tomamos consciência da realidade, que nos tornamos responsáveis e capazes de ter um pensamento próprio, consciente e crítico sobre o mundo e sobre nós próprios. Os diversos conhecimentos escolares dão-nos instrumentos para sermos mais capazes de interpretar os acontecimentos do mundo em que vivemos e do nosso lugar nele. Por acaso é o mundo do século XXI. 
A escola desempenha neste processo uma função importante e insubstituível. As diversas disciplinas do currículo contribuem sob diversas formas para este desiderato. As denominadas visitas de estudo têm muitas vezes o importante papel de articular saberes e mostrar como o que se aprende em contexto escolar não está separado da vida. Pelo contrário, é o modo de nos aproximar da vida social e cultural que nos faz acordar para a importância de cada um como participante ativo da sua história pessoal e da história coletiva. 
Este post regista a Visita de Estudo, programada no âmbito das disciplinas de Filosofia, Português e Inglês, com os alunos do 10º ano, turmas B, C e F, às Exposições da Fundação Calouste Gulbenkian...

OLHAR, VER, INTERPRETAR

Como vemos e o que vemos realmente? Olhar e ver significarão exatamente a mesma coisa? Haverá olhares que não envolvam o pensamento? Como lemos uma obra de arte? A partir de uma seleção de obras da Coleção Moderna ou da Coleção do Fundador, a visita incide sobre o olhar e a perceção, convidando os alunos a discutir, a observar, a tomar decisões, a escolher perspetivas e pontos de vista na leitura das obras de arte, com base no seu universo de referentes.                        Imagem e texto retirados de https://gulbenkian.pt/descobrir/atividade/olhar-ver-interpretar-5/

e ...

Da Idade Média ao Renascimento


O que haverá em comum entre um monge copista de um mosteiro medieval e um artista do Renascimento? A Idade Média e o Renascimento são períodos históricos com visões do mundo muito distintas, apesar de partilharem alguns valores centrais. O que há de comum entre ambos e o que mudou radicalmente?
Será que através de um manuscrito medieval conseguimos compreender como era o dia-a-dia de um homem da Idade Média? E de que maneira um retrato renascentista traduz o pensamento de quem pediu para ser representado? Ainda dominaremos os mesmos códigos de comunicação? 
Quando pensamos nestes períodos da história europeia, pensamos sobretudo do ponto de vista da história cristã. Porém, vale a pena debruçarmo-nos sobre as relações com a cultura islâmica. Como eram os contactos e as trocas? 
Algumas destas questões irão guiar-nos enquanto exploramos as obras da Coleção, e vão levar-nos a refletir sobre diferentes construções de paradigmas e leituras do mundo.
Mais informações sobre esta visita e sobre a envolvência e participação dos alunos podem ser vistas aqui, no Moodle da Escola Secundária de Madeira Torres: 
E ainda nos links de acesso ao padlet dos alunos das turmas 10ºB, C e F:


quinta-feira, 23 de abril de 2020

Isto é arte

Sim, é arte. Refiro-me a um filme de animação, uma curta-metragem da autoria de Suzie Templeton intitulada "Pedro e o Lobo", que recorre às mais avançadas técnicas digitais. A autora é uma realizadora conceituada e este filme ganhou vários prémios, incluindo o Óscar de Melhor Curta-Metragem (animação) em 2008.

Esta obra é uma nova versão, uma recriação da obra musical do compositor russo Serguei Prokofiev (1891-1953), de 1936. Nesta reinterpretação os caçadores não matam o lobo, como acontecia no original russo, e Pedro devolve-o à floresta, ao seu habitat natural, revelando-se, assim, uma nova consciência ambiental. O filme de Suzie Templeton foi estreado no Royal Albert Hall em Londres e teve a banda sonora executada, ao vivo, pela Philharmonia Orchestra de Londres. É um filme de animação comovente, de extraordinária beleza e expressividade. A técnica fílmica é utilizada de modo perfeito, com planos e movimentos de câmara que conferem uma gama de emoções e de dramaticidade às cenas, acompanhando a música e a história, que envolve completamente o espectador.

Antes de visionar o filme, talvez seja bom ver esta introdução aos instrumentos utilizados na composição musical e à sua relação com as personagens da história. Existe também uma adaptação dos estúdios Disney, em 1946, que tem uma primeira parte onde isso é explicado. Pode ser visto aqui, dobrado em português do Brasil.









quarta-feira, 22 de abril de 2020

O que é a arte? (2)

O que é a arte? Esse é um problema filosófico para o qual não há uma resposta, mas mais do que uma. Há várias teorias que procuram entender o fenómeno da criação artística e das obras de arte. Porém, antes de abordarmos as teorias, os argumentos que as sustentam e as objeções que suscitam, convém percebermos de que estamos a falar. Esta publicação é introdutória às teorias da arte. 

Diz-se das obras de arte, das grande obras de arte, que atravessam o tempo. Quer dizer, elas continuam a ser apreciadas independentemente da época em que foram originalmente criadas. E ser apreciadas, porquê? Porque é que não caem no esquecimento, não desaparecem? Precisamente porque o público que as recebe, embora tenha uma vivência histórica e cultural diferente, pode ser sensível a essa obra. 
Também acontece com estas obras de arte, denominadas  por isso "clássicas", suscitarem recriações. Quer dizer, os artistas de hoje trabalham a partir delas e, com os meios atuais, fazem ressaltar um significado que ilumina o nosso presente. Por exemplo, há peças de teatro escritas no século V a.C., da época dos sofistas e de Sócrates, que continuam ainda hoje a ser representadas. E não continuam a ser representadas por serem antigas (a antiguidade não é, por si só, nenhum valor) mas porque elas ainda continuam a lançar-nos interrogações e a ajudar-nos a compreender melhor o mundo. Milhares de anos após, centenas de anos após, somos ainda seres humanos com inquietações idênticas. 
Shakespeare, por exemplo, dramaturgo inglês dos séculos XVI-XVII, já mais perto do nosso tempo mas, ainda assim, bem distante, continua a ser representado por todo o mundo e, nomeadamente, o seu Romeu e Julieta já deu lugar também, não só a várias representações teatrais, como a obras de pintura, a obras musicais, a bailado, a cinema (a sétima arte) e, ainda há bem pouco tempo, quer dizer, nos finais do século XX, em 1996, a uma nova adaptação cinematográfica por Luhrmann, com Leonardo di Caprio num dos principais papéis.
Concluindo, estamos rodeados de arte, estamos imersos na história e nem damos por isso. 



O filme, a quem puder interessar, pode ser visto aqui.
https://YouTube/watch?v=WhT7YKeJ2iY

TAREFAS
1. Como é que definiria "arte"?
2. Porque é que o cinema é considerado a sétima arte?
3. O que é que faz que haja obras que são pouco conhecidas e que haja outras que são conhecidas praticamente por todos? Identifica vários fatores.



O que é a arte? O que pode ser classificado como arte?(1)

Há obras de arte que não suscitam qualquer dúvida quanto ao seu estatuto. Outras, não tanto.

Sugestão para uma atividade.

1. Olhe para as imagens seguintes. 
1.1. Escolha uma destas opções para cada uma delas.

A) É Arte. Estou seguro.
B) Não é arte.
C) Sei que é arte, mas não sei porquê.
D) Tenho dúvidas.

1.2. Justifique a sua opção relativamente a, no máximo, DUAS delas.


Imagem 1 
Leonardo da Vinci (1452-1519), "Mona Lisa". pintura, no Museu do Louvre


Imagem 2


A Vénus de Milo, atualmente no Museu do Louvre, foi descoberta em 1820, na ilha grega de Milos, no centro das Cíclades. Calcula-se que tenha sido esculpida em 100 A.C.O


Imagem 3


Graça Morais (1948), A Caminhada do Medo (2011) pintura
(imagem retirada de http://gracamorais.blogspot.com/2011/10/graca-morais-2011-caminhada-do-medo.html)


Imagem 4


Helena Almeida (1934-2018) da série "O abraço" (2006). fotografia


Imagem 5


Marina Abramovic (1946), AAA-AAA (1978) performance.
Em AAA-AAA, Marina e Ulay gritam um com o outro durante 25 minutos. Esta performance aconteceu em Amesterdão em 1978 e foi gravada em filme. 

Informação retirada do suplemento Ípsilon do jornal Público de 2 de março de 2020. 
Imagem 6



Marcel Duchamp (1887-1968), "Fonte" (2017), porcelana

Imagem 7

Edward Munch (1863-1944), da série "O grito" (1893)

Imagem 8



J. Vermeer (1632-1675), Rapariga com brinco de pérola, pintura.


Imagem 9

Paul Cézanne( 1839- 1906), Lago de Annecy (1896), pintura
Imagem 10


Frida Kahlo (1907-1954) " A Coluna Partida"(1944), pintura.

domingo, 19 de abril de 2020

A exposição de Ai Weiwein faz dele "o artista mais popular do mundo" (2)

De 2 de outubro a 2 de novembro, de 2019, a Galeria Lissen, em Londres, apresentou uma grande exposição de Ai Weiwein, com o título "Raízes", após uma primeira mostra no Brasil, em S. Paulo. É possível ver aqui, no site oficial, um video representativo:
https://www.lissongallery.com/exhibitions/ai-weiwei-roots (consulta a 18 de abril de 2020)



No jornal Público, pouco tempo depois, a 14 de novembro de 2019, é publicado um artigo de Francisco Bettencourt sobre esta exposição e sobre o autor.

«Raízes de árvores encontradas na costa brasileira, tratadas, moldadas, ligadas e cobertas por ferro fundido de maneira a criar enormes esculturas de quatro a seis metros por dois ou três, sólidas e pontiagudas, espetros da floresta com formas surpreendentes, de cor castanha alaranjada, obtida através da patina ferrugenta.»

Nesse mesmo jornal, precisamente este mês, a 1 de abril, no título apelativo do artigo de Lucinda Canelas, Ai Weiwein é apelidado "o artista mais popular do mundo", de acordo com o critério das exposições mais vistas de um artista, a título individual.

«Esta mostra, que inclui as suas esculturas feitas a partir das raízes de uma árvore protegida da floresta atlântica brasileira, a pequi-vinagreiro, foi vista por mais de 1,1 milhões de pessoas no total dos quatro locais e terá registado tão grande afluência, avança como hipótese o Art Newspaper, porque, quando estava no Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio (onde teve 600 mil visitantes), coincidiu com os grandes fogos na Amazónia, que comoveram o mundo e colocaram a tónica na protecção do meio ambiente


Retomamos o artigo de F.  Bettencourt:

«A obra de Weiwei, um dos maiores artistas contemporâneos, é feita na constante reflexão sobre a matéria. Para esta exposição ele visitou a costa do Brasil, trabalhou com comunidades e artesãos locais, selecionou raízes das árvores Pequi Vinagreiro em risco de extinção em Trancoso, Bahia. O protesto em relação ao nosso desenraizamento é patente, conjugado com a profunda simpatia pela sorte dos refugiados e a denúncia da constante agressão contra a floresta e os seus habitantes.»



«A sua própria condição de refugiado – Weiwei não tem passaporte da China, foi detido várias vezes pelo seu governo, tem um estúdio em Berlim e vive agora em Cambridge – está presente nesta tomada de posição pela recuperação da relação crucial entre os humanos e a natureza de que todos dependemos». Neste artigo, Ai Weiwei é classificado como artista concetual.

Nota: Os artigos do jornal Público a fazemos referência podem ser consultados em: https://www.publico.pt/2019/11/14/culturaipsilon/opiniao/ai-weiwei-1893095 e em

sábado, 18 de abril de 2020

O artista Ai Weiwei e a arte "efémera"



A arte denominada "efémera" não é feita para perdurar no tempo. A arte efémera surge no século XX e nega a ideia tradicional de arte associada a um objeto que se cristaliza e perdura temporalmente. Por exemplo, um quadro, uma escultura, um romance podem ser considerados obras de arte perduráveis. A arte efémera não visa a produção de um "objeto" propriamente dito, sendo os seus materiais destinados a serem destruídos ou a desaparecerem. Ao mesmo tempo ela supõe a presença do público. Ela não apela à contemplação, mas à ação. O público neste género de obra é sempre desafiado a envolver-se, sob formas que podem ser, no entanto, muito diversas.

Escolhemos nesta publicação um artista chinês contemporâneo, Ai Weiwei, artista reconhecido de projeção internacional. Ai Weiwei teve problemas no seu país natal, tendo sido preso em 2011 e conseguindo sair do país em 2015. 

Um dos grandes temas do seu trabalho artístico é o da crise dos refugiados na Europa e no mundo. A esse propósito, realizou uma instalação em 2016 na fachada de uma sala de concertos, em Berlim, na Alemanha.



Instalação de Ai Weiwei em frente da Konzerthaus em Berlim, via Getty Images.
Idem, visão lateral.


Idem. Visão lateral.


Pormenor da construção


Coluna, visão de pormenor

Consegue perceber o que cobre as colunas deste prestigiado edifício de Berlim?


Sim, são coletes. Mas não são quaisquer coletes. São coletes de homens, mulheres e crianças que atravessaram o mar em pequenos botes a abarrotar fugindo da guerra, da fome, do sofrimento. Fugindo para uma Europa que lhes aparecia como uma esperança, como possibilidade de terem uma vida digna. Os que chegam, sim, os que chegam, porque morrem milhares nesta travessia, chegam a uma Europa que os afasta, os cataloga de refugiados, sem pátria, sem nome próprio, sem direitos. Sim, são os seus coletes. São os coletes que vestiram, que se molharam, que lhes salvaram a vida ou que com eles morreram. 

São 14 000, catorze mil, coletes.
É a esta realidade humana que Ai Weiwei pretende dar visibilidade.

ATIVIDADE
1. O que lhe parece que representa cada colete?
2. Porque é que o artista teria escolhido este edifício?
3. O que sentes perante esta obra (ainda que apenas em fotos parcelares)?
4. Esta instalação faz-nos (a nós, o público) refletir?
5. Porque é que se pode classificar esta instalação uma obra de arte? Justifica, recorrendo a uma das teorias estudadas.
6. Comenta: "Os artistas não vivem num mundo à parte. Eles são participantes ativos na sociedade em que vivem e a arte pode ser uma forma de intervenção".