terça-feira, 24 de novembro de 2020

A vacina contra a Covid 19 é segura?

Desta vez, desafiamos os nossos alunos a aplicarem os seus conhecimentos sobre argumentos na análise desta notícia. 

Damos algumas pistas...

O argumento indutivo, para ser bom, necessita de preencher alguns requisitos. As inferências indutivas apresentam sempre uma margem de risco, por isso é preciso garantir certos procedimentos para nos assegurarmos do valor da nossa conclusão. Por exemplo, temos de trabalhar com uma "amostra ampla e representativa"...

Publicamos, então, esta notícia do jornal "Público" de 19 de novembro intitulada 

Covid 19: vacina de Oxford é "segura" e também provoca resposta imunitária em pessoas mais velhas.

A potencial vacina contra o novo coronavírus que está a ser desenvolvida pela Universidade de Oxford e pela farmacêutica AstraZeneca revelou-se “segura” e produziu uma resposta imunitária em pessoas acima dos 56 anos — aquelas que são mais propensas a desenvolver uma forma grave de covid-19. A vacina experimental já tinha mostrado resultados semelhantes numa faixa etária mais jovem, em adultos entre os 18 e os 55 anos. Os resultados da segunda fase dos ensaios, considerados “promissores”, foram publicados esta quinta-feira na revista científica The Lancet.

Na segunda fase dos ensaios clínicos, 560 participantes (160 entre os 18 e os 55 anos, 160 entre os 56 e os 69 anos e 240 com 70 anos ou mais) foram divididos em dez grupos e receberam a vacina da covid-19 (baptizada ChAdOx1 nCoV-19) ou uma vacina de “controlo”, neste caso a da meningite. Os participantes com mais de 55 anos também foram divididos em grupos e receberam uma única dose da vacina ou duas doses num intervalo de 28 dias.

Assim, os resultados mostram que a vacina causa poucos efeitos secundários e induz respostas imunitárias em todas as faixas etárias (quer tenha sido administrada uma dose baixa ou uma dose normal), provocando uma resposta imunitária dos linfócitos T, células importantes na criação de imunidade, num período de 14 dias após a vacinação. Quer isto dizer que a vacina é capaz de encontrar e atacar as células infectadas com o vírus. Por outro lado, o fármaco também provocou uma resposta de anticorpos dentro de 28 dias após a dose de reforço, o que significa que consegue encontrar e atacar o vírus SARS-CoV-2 quando este está a circular no sangue ou no sistema linfático.

A fase três dos ensaios está já em andamento para confirmar os resultados agora divulgados e para perceber o grau de eficácia da vacina na protecção contra a infecção pelo SARS-CoV-2 num grupo mais alargado de pessoas, incluindo idosos com problemas graves de saúde — até porque a fase dos ensaios que está agora terminada só incluiu cidadãos saudáveis que podem não ser representativos da generalidade da população mais idosa.

“As respostas imunitárias das vacinas são, muitas vezes, menores em adultos mais velhos porque o sistema imunitário se deteriora gradualmente com a idade, algo que também deixa os idosos mais susceptíveis a infecções. É crucial que as vacinas da covid-19 sejam testadas neste grupo, que também é um grupo prioritário para a imunização”, refere Andrew Pollard, professor da Universidade de Oxford (Reino Unido) e o principal autor do estudo. Pollard disse ainda que os resultados finais devem ser conhecidos até ao Natal.

Já Maheshi Ramasamy, co-autor, diz que as respostas geradas pela vacina em pessoas idosas “são encorajadoras” e espera que isto signifique que possa ajudar a proteger algumas das pessoas “mais vulneráveis ​​da sociedade”. “Precisamos de mais estudos antes de podermos dizer isso com certeza”, afirma, citado no comunicado da The Lancet.


A investigadora Sarah Gilbert afirmou que o estudo dá algumas respostas sobre a protecção de pessoas mais velhas, mas que ainda há dúvidas “sobre a eficácia e a duração da protecção”, que terão que ser confirmadas “em pessoas mais velhas com doenças pré-existentes”.

Depois da vacinação, os voluntários foram observados por um período mínimo de 15 minutos para se perceber se poderiam ocorrer efeitos nocivos imediatos, mas nada foi registado num período de sete dias. As reacções adversas à vacina ChAdOx1 nCoV-19 foram moderadas — os efeitos mais comuns foram dor e sensibilidade no local da injecção, fadiga, dor de cabeça, febre e dores musculares —, mas mais comuns do que as observadas com a vacina de controlo.

Foram registados “13 eventos graves nos seis meses após a primeira dose ser foi administrada, mas nenhum dos quais está relacionado com as vacinas em estudo”, lê-se no estudo. Os participantes vão continuar a ser monitorizados durante um ano após a vacinação. Os testes da vacina chegaram a ser suspensos em Setembro depois de um voluntário ter tido uma reacção adversa grave, mas foram retomados poucos dias depois.

Há 47 candidatas a vacinas em ensaios clínicos (em pessoas) e dez estão na fase 3 (em que é feita a avaliação dos resultados do fármaco em milhares de voluntários), segundo documentação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 3 de Novembro. A vacina de Oxford é uma das que surgem na frente da corrida para encontrar uma vacina viável para combater a infecção pelo coronavírus SARS-CoV-2. A equipa foi uma das primeiras a iniciarem ensaios clínicos em humanos.


Nas últimas semanas, várias empresas de biotecnologia e farmacêuticas tem-se chegado à frente e apresentado resultados (alguns ainda preliminares) dos ensaios clínicos das suas vacinas, entre estas a Pfizer e a sua parceira alemã BioNTecha Sinovaca Moderna e o Fundo de Investimento Directo Russo, que está a desenvolver a vacina Sputnik V.

Notícia retirada daqui: https://www.publico.pt/2020/11/19/ciencia/noticia/covid19-vacina-oxford-segura-tambem-provoca-resposta-imunitaria-pessoas-velhas-1939750, consulta a 24 de novembro, 2020.



Ainda o Dia Mundial da Filosofia 2020

A M.L., aluna do 10ºano, tem vindo a descobrir a Filosofia...

Decidiu, para este Dia Mundial da Filosofia, organizar este desdobrável, onde reuniu algumas ideias que a atraíram sobre a questão da Felicidade...






quinta-feira, 19 de novembro de 2020

PANDEMIA E FILOSOFIA (7)

 Nota: os subtítulos são da nossa responsabilidade.

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA

 

 

Filosofia e Pandemia: uma lista de problemas

 

João Cardoso Rosas, filósofo,

Professor na Universidade do Minho 


7. A dimensão existencial da filosofia ou para além da ética e da política

 

Para terminar, creio ser importante referir que a filosofia tem também uma dimensão existencial relevante, vocacionada para enfrentar na primeira pessoa as grandes interrogações sobre a vida, a morte, o nosso destino individual e coletivo. A filosofia, segundo a máxima ciceroniana de Montaigne, consiste em "aprender a morrer". Desde as grandes escolas filosófica das Antiguidade tardia, como o estoicismo e o epicurismo, ao existencialismo contemporâneo de autores como Camus e Sartre, passando por muitos outros, a filosofia pode ser um bálsamo para tempos difíceis ou, pelo contrário, um acordar das consciências adormecidas pelo efeito anestesiante da quotidianidade. Esta dimensão da filosofia, indo para além das áreas da ética e da política que aqui me propus tratar, será com certeza central nos próximos tempos, durante e após a pandemia[Conclusão]

 

Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias a 19 de setembro 2020, excerto. Disponível em https://www.dn.pt/edicao-do-dia/19-set-2020/filosofia-e-pandemia-uma-lista-de-problemas--12734662.html


PANDEMIA E FILOSOFIA (6)

 Nota: o subtítulo é da nossa responsabilidade.

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA

 

Filosofia e Pandemia: uma lista de problemas

João Cardoso Rosas, filósofo,

Professor na Universidade do Minho

 

6. O que fazer? Quem decide?

Um outro desafio que a pandemia lança é o do papel dos especialistas no processo de tomada de decisões. A ideia geral é que cabe aos especialistas, sobretudo cientistas, indicar aos políticos o que fazer - e que a fonte dos nossos problemas é o desrespeito pela opinião científica especializada. Não deixando de salvaguardar o papel dos experts, esta visão epistocrática tem de ser confrontada com uma epistemologia mais democrática e aberta à opinião dos não especialistas.

Com a crescente perceção dos problemas económicos provocados pela pandemia e pelo combate à pandemia, surge com maior acuidade a questão dos efeitos assimétricos da crise em função das desigualdades sociais preexistentes. Com a pandemia, será necessário voltar à reflexão sobre a justiça distributiva e incidir especialmente nos cuidados de saúde. Um outro aspeto específico da reflexão contemporânea sobre a justiça que terá de ser reavaliado é o da justiça em relação aos mais velhos e da justiça intergeracional (em relação às próximas gerações), dada a terrível situação vivida nos lares para idosos e a previsibilidade de mais pandemias no futuro.

Uma crise preexistente a esta pandemia é a dos refugiados e migrantes económicos que tem pressionado não apenas a Europa mas também várias outras partes do mundo. As crises de saúde e económicas que se avizinham nas regiões mais pobres do globo farão certamente eclodir novos movimentos de pessoas à procura de segurança física e económica. Em contexto pandémico, a questão da permeabilidade das fronteiras, da sua maior abertura ou fechamento, assim como da capacidade das sociedades de acolhimento para a integração dos novos migrantes, estará na ordem do dia. (continua)

Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias a 19 de setembro 2020, excerto. Disponível em https://www.dn.pt/edicao-do-dia/19-set-2020/filosofia-e-pandemia-uma-lista-de-problemas--12734662.html


PANDEMIA E FILOSOFIA (5)

 Nota: os subtítulos são da nossa responsabilidade.

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA

 

Filosofia e Pandemia: uma lista de problemas

João Cardoso Rosas, filósofo,

Professor na Universidade do Minho

 

 

5. Um desafio para a democracia

As questões relacionadas com a tecnologia conduzem a uma outra, mais genérica: a do eventual abuso do "estado de emergência", colocada, como vimos, por Agamben, entre muitos outros. Este tema é obviamente relevante quando abordado com respeito pelos dados empíricos. Os estados de exceção constitucionalmente previstos não têm de ser vistos como forma de minar a Constituição, ou como a revelação de que, no fundo, a Constituição não é democrática, mas antes como mecanismos internos que permitem salvaguardar a democracia em situações-limite, desde que não sejam prolongados indefinidamente (como acontece atualmente na Hungria).

No contexto histórico em que vivemos, a grande questão para a democracia tem a ver com a concorrência global com os regimes autocráticos, que tendem a reivindicar a sua superioridade no combate à epidemia. O cenário atual mostra uma disputa internacional entre os modelos democráticos, por um lado, e os modelos autocráticos como o chinês, por outro lado. Além disso, muitas democracias estão agora em crise interna, sob a pressão dos populismos que, nascendo em contexto democrático, tendem a arrastar essas democracias para o lado autocrático. Este é um desafio maior para a teoria democrática.

(continua)

Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias a 19 de setembro 2020, excerto. Disponível em https://www.dn.pt/edicao-do-dia/19-set-2020/filosofia-e-pandemia-uma-lista-de-problemas--12734662.html

PANDEMIA E FILOSOFIA (4)

 Nota: os subtítulos são da nossa responsabilidade.

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA

 

Filosofia e Pandemia: uma lista de problemas

João Cardoso Rosas, filósofo,

Professor na Universidade do Minho

 

3. Ética animal e ética ambiental

Um problema que tem sido correntemente levantado relaciona-se com a origem do novo coronavírus. O facto de a transmissão para humanos se ter dado num mercado onde se transacionavam espécies animais selvagens coloca no centro do problema da origem a relação entre o homem e a natureza. Há muito que as diversas correntes filosóficas da ética animal e da ética ambiental procuram criticar a relação de exploração e manipulação que existe em relação às espécies selvagens. Neste aspeto, a pandemia vem confrontar, de forma particularmente clara, as visões antropocêntricas prevalecentes que consideram que a natureza, incluindo os animais não humanos, é apenas um recurso ao serviço da espécie humana.

4. Liberdade versus segurança?

Uma outra questão tem a ver com o uso de tecnologias para a vigilância dos cidadãos e o controle da pandemia. A existência de novas tecnologias de vigilância e monitorização dos indivíduos coloca inúmeros problemas ao modo como concebemos a nossa relação com o Estado e, especificamente, como interpretamos as liberdades fundamentais que as democracias procuram estabelecer e preservar. Ainda no domínio da reflexão sobre a tecnologia, é de salientar a importância crescente das aplicações que tornam possível desempenhar à distância as tarefas que antes considerávamos apenas in propria persona. Estas transformações põem em causa a visão tradicional das relações interpessoais e dos laços de sociabilidade. (continua)

Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias a 19 de setembro 2020, excerto. Disponível em https://www.dn.pt/edicao-do-dia/19-set-2020/filosofia-e-pandemia-uma-lista-de-problemas--12734662.html

PANDEMIA E FILOSOFIA (3)

 Nota. os subtítulos são da nossa responsabilidade.

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA

 

Filosofia e Pandemia: uma lista de problemas

João Cardoso Rosas, filósofo,

Professor na Universidade do Minho

 

2. Os problemas ético-políticos

Embora outros exemplos pudessem ser dados, creio que o "caso Agamben" é suficiente para ilustrar o tipo de abordagem filosófica a evitar. Convém agora explicitar as razões pelas quais julgo que, ainda assim, a filosofia pode ter algo de relevante a acrescentar sobre a pandemia, desde que abandone o registo especulativo e oracular de pensadores como Agamben. Por falta de espaço, farei aqui um mero elenco de problemas, sobretudo de natureza ético-política, alguns dos quais têm já sido objeto de intervenção pública também entre nós, por autores como José Gil, Maria do Céu Patrão Neves ou Viriato Soromenho-Marques, entre outros.

O primeiro desses problemas tem a ver com o medo que a pandemia provoca. Thomas Hobbes, o fundador do pensamento político moderno, considerava que o medo da morte é a nossa paixão fundamental. Na ausência de um estado politicamente organizado prevalece o medo e a vida dos homens tende a ser difícil e breve. A pandemia, tal como acontece geralmente com catástrofes naturais, ou com a guerra, especialmente se for guerra civil, veio recordar-nos a fragilidade das sociedades politicamente organizadas e o modo como elas podem rapidamente cair na anomia se não existir uma condução política da situação. Com certeza que nos próximos tempos os filósofos voltarão a este tipo de reflexão sobre o papel social e político do medo, mas também o de outras paixões que o contrariam (a generosidade, o altruísmo).

Um outro problema, muito específico, colocou-se cedo e com especial acuidade. Trata-se de saber, de um ponto de vista ético, como distribuir cuidados de saúde numa situação de elevada procura e grande escassez de recursos. O critério mais aconselhado na literatura Ética é o do número de anos de vida com qualidade que se projeta para cada um dos indivíduos em causa. Por isso mesmo é que, quando temos de escolher entre salvar uma criança saudável ou alguém com muita idade ou que morreria em breve de outra doença, a escolha se impõe. Mas deve notar-se que este critério é de natureza consequencialista e pode entrar em choque com as nossas convicções sobre o valor absoluto da dignidade humana. [continua]

Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias a 19 de setembro 2020, excerto.

 

Disponível em https://www.dn.pt/edicao-do-dia/19-set-2020/filosofia-e-pandemia-uma-lista-de-problemas--12734662.html

 

PANDEMIA E FILOSOFIA (2)

 Nota: os subtítulos são da nossa responsabilidade.

Filosofia e Pandemia: uma lista de problemas

 

João Cardoso Rosas, filósofo,

Professor na Universidade do Minho

 

1.     A epidemia não é uma conspiração do poder

Giorgio Agamben [filósofo italiano] reagiu prontamente ao alastrar da epidemia em Itália. No dia 26 de fevereiro [2020] publicou um texto em que lança dúvidas sobre a realidade factual da epidemia falando sobre "uma suposta pandemia" e considerando as medidas de emergência como "irracionais e totalmente infundadas". A suspeição levantada por Agamben, quando existiam já "zonas vermelhas" na Lombardia, está ancorada na sua filosofia e, mais especificamente, na convicção de que a governação atual tende a usar a ideia de "estado de emergência" como seu paradigma de atuação.
Agamben insistiu na mesma linha argumentativa num outro artigo, publicado no dia 11 de março. Segundo este autor, algo semelhante ao que atualmente vivemos terá acontecido com a chamada "guerra ao terrorismo". Perante o declínio desta "guerra", os governos inventaram outra, a "guerra ao vírus", de modo a poderem continuar a justificar a expansão dos seus poderes e a limitação das liberdades dos cidadãos. No quadro do combate ao terrorismo, os cidadãos foram todos transformados em potenciais terroristas e tratados como tal. No contexto da "suposta" pandemia, os cidadãos são potenciais contagiadores e por isso devem ser vigiados e mantidos à distância. Daí o favorecimento do teletrabalho, ou do ensino não presencial.
Não é difícil simpatizar com os receios de Agamben sobre as transformações políticas induzidas pela pandemia. É sem dúvida importante denunciar, como ele o faz, os usos perversos da linguagem - a "guerra" - a que recorre o discurso político no contexto pandémico. Mas o que verdadeiramente choca na sua intervenção é a negação categórica das evidências empíricas: a epidemia não é real, mas "suposta". As medidas dos governos não visam salvar vidas, são apenas uma conspiração do poder. Porque pensa que a governação atual tem como paradigma a criação de um "estado de emergência" permanente, Agamben reinterpreta, ou sobreinterpreta, factos que à partida não pareciam contestáveis. A realidade é forçada para dentro da teoria, por assim dizer. (continua)

Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias a 19 de setembro 2020, excerto.

Disponível em

https://www.dn.pt/edicao-do-dia/19-set-2020/filosofia-e-pandemia-uma-lista-de-problemas--12734662.html

PANDEMIA E FILOSOFIA (1)

Sob este título Pandemia e Filosofia, iniciamos a publicação de um conjunto de textos, que demos a conhecer na nossa escola através da sua distribuição na sala de professores e de uma pequena exposição na BECRE. Este ano, as condições não permitiram um maior envolvimento dos alunos no espaço escolar. O primeiro texto é de Viriato Soromenho-Marques e os restantes de João Cardoso Rosas, selecionados pelo seu enquadramento no tema do Dia Mundial da Filosofia deste ano. Ambos correspondem a excertos de dois artigos que foram publicados na imprensa, no jornal Diário de Notícias. O artigo de João Cardoso Rosas, pela sua extensão, foi dividido por nós em capítulos, aos quais foram atribuídos títulos para melhor legibilidade. 


DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA

Pandemia e hierarquia de valores

Viriato Soromenho-Marques, filósofo,

Professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

 

Se o SARS-CoV 2 fosse uma arma, seria quase perfeita. A arma mais eficaz não é a mais letal, mas aquela que causa mais feridos de longa duração, que sobrecarrega as estruturas logísticas e hospitalares, que semeia o medo e a discórdia, que diminui a capacidade de luta através da entropia e desmoralização da sociedade. É exatamente o que estamos a observar - de modo ainda mais refinado do que na primavera - nestes primeiros passos da segunda vaga da covid-19.

Estamos num momento de encruzilhada em toda a Europa. Seria conveniente analisarmos dois "pontos cegos" fundamentais no modo como encaramos o que está a acontecer. A sua elucidação poderá ajudar-nos, como cidadãos, a fazer um juízo crítico e a agir em conformidade. O primeiro aspeto negligenciado prende-se com a falta de humildade de muitas das opiniões e críticas à ação dos governos. É claro que os governos devem ser escrutinados e criticados, o que é inadmissível é o caudal de críticas insensatas, vindas também de peritos, que arrogantemente escamoteiam a colossal ignorância que ainda temos sobre este novo coronavírus. Recordo a ligeireza como alguns especialistas se têm atrevido a prometer vacinas para datas próximas, mantendo-se imperturbáveis perante o número crescente de testes que são interrompidos por efeitos indesejáveis na saúde dos voluntários. Ou ainda a sobranceria como responsáveis de saúde pública falam em "imunidade de grupo", para justificar os erros grosseiros cometidos, por exemplo, pelas autoridades de saúde suecas. (…)

O desprezo pelo direito à vida tem unido uma frente bastante insólita e disparatada que vai de Trump e Bolsonaro a intelectuais de "esquerda", como Giorgio Agamben. Para Trump, a vida dos mais frágeis não pode parar o curso normal dos negócios. Para Agamben, só um Leviatã tirânico seria capaz, para salvar a "vida nua" dos cidadãos, de os confinar compulsivamente... Os Estados europeus estão a devolver à autodisciplina dos cidadãos a tarefa de evitar novo confinamento. Trata-se de conciliar a liberdade individual com a responsabilidade que, em tempos pandémicos, cada um tem pelo direito à vida de todos os outros. Se as democracias europeias falharem na defesa da vida, todos conhecemos como abundam autoritarismos que a prometem salvar, em troca do sacrifício de todos os outros direitos que a tornam digna de ser vivida.

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Artigo publicado no Jornal Diário de Notícias, na edição de 17 de outubro, 2020

Disponível em https://www.dn.pt/edicao-do-dia/17-out-2020/pandemia-e-hierarquia-de-valores-12929448.html

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA - O TEMA DESTE ANO

 


A edição de 2020 deseja convidar o mundo inteiro a refletir sobre o sentido da pandemia em curso, sublinhando a necessidade mais do que nunca essencial de recorrer à reflexão filosófica para fazer face às múltiplas crises que atravessamos.

A crise sanitária interroga múltiplos aspetos das nossas sociedades. Neste contexto, a filosofia ajuda-nos a dar o passo atrás necessário para melhor avançar, estimulando a reflexão crítica sobre os problemas já presentes mas que a pandemia levou ao paroxismo.

Retirado de: https://www.un.org/fr/observances/philosophy-day, consulta a 17 de novembro 2020.

Para saber mais:

https://fr.unesco.org/news/limportance-philosophie-temps-crise-theme-journee-mondiale-2020




Porquê um dia da Filosofia?

 Do site oficial da UNESCO, traduzimos o seguinte texto

PORQUÊ UM DIA DA FILOSOFIA ?

Numerosos pensadores salientam que o «espanto» («l’étonnement» ) se encontra no centro da filosofia. Certamente, a filosofia surgiu desta tendência natural dos homens em espantarem-se deles próprios e do mundo no qual vivem.

Esta disciplina que se pretende «sabedoria» ensina-nos a refletir sobre a reflexão, a voltar a pôr em questão verdades bem estabelecidas, a verificar hipóteses e encontrar conclusões.

Desde há séculos, e isto em todas as culturas, a filosofia originou conceitos, ideias e análises assentando assim os fundamentos do pensamento crítico, independente e criativo. O Dia da Filosofia da Unesco permitiu a esta instituição celebrar muito particularmente a importância da reflexão filosófica e a encorajar as populações do mundo inteiro a partilhar entre elas a sua herança filosófica.

Para a UNESCO, a filosofia oferece os fundamentos concetuais dos princípios e dos valores de que a paz mundial depende – a democracia, os direitos humanos, a justiça e a igualdade.

A filosofia permite consolidar estes autênticos fundamentos da coexistência pacífica.

Este dia oferece-nos ocasião de nos colocarmos, a nós próprios, questões frequentemente esquecidas: de que nos esquecemos nós de refletir? A que realidades intoleráveis nos habituamos?

Disponível em https://www.un.org/fr/observances/philosophy-day, consulta a 17 de novembro de 2020.

 (tradução do original francês da responsabilidade do Grupo Disciplinar de Filosofia da Escola Secundária de Madeira Torres)

DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA 2020

 
DIA MUNDIAL DA FILOSOFIA                

Passado um ano, aqui estamos de novo a celebrar o Dia Mundial da Filosofia.

Instituído em 2005 pela Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura (UNESCO), o Dia Mundial da Filosofia é celebrado todos os anos na terceira quinta feira do mês de novembro. Tem vindo a ser comemorado na nossa escola desde 2006.

Eis a imagem do cartaz da nossa escola...

Labirinto do minotauro na Casa dos Repuxos em Conímbriga 

sábado, 26 de setembro de 2020

Dicionário Filosófico - Dogma

Há termos que são usados em diversos contextos, podendo assumir significados diferentes. É o caso do termo "dogma" e de outros da mesma família, como "dogmatismo" ou "dogmático". Sendo assim, convém que selecionemos o significado mais esclarecedor para alunos que se iniciam no estudo da filosofia.

Transcrevemos a definição do Dicionário Escolar de Filosofia em https://criticanarede.com/d.html 

dogma

Uma afirmação ou teoria cujo partidário se recusa a discutir e para a qual não apresenta quaisquer razões sólidas. Por exemplo: quem defende que os animais não têm direitos porque são animais, e se recusa a discutir o tema, está a afirmar um dogma. Neste sentido, a filosofia, a ciência e as artes opõem-se ao pensamento dogmático dado que tendem a favorecer a diversidade e a discussão aberta. (Desidério Murcho)



sábado, 25 de julho de 2020

Visita de Estudo à Casa de Saúde do Telhal (9)

Terminamos este conjunto de publicações com alguns excertos de textos dos nossos alunos, dando conta da importância desta visita à Casa de Saúde do Telhal.

 "É preciso mostrar a cara"
 Instalação vídeo de um utente da Casa de Saúde do Telhal, foto de E.G., 12º, I.

«Este terá sido o lema, ao longo de todo o dia: os utentes não são uma doença, são pessoas tal como nós.»


« Os problemas de saúde mental afetam várias áreas da vida pessoal, familiar e profissional das pessoas que os rodeiam e é neste preciso ponto que temos de demonstrar especial atenção, na medida em que teremos de ter o dobro do cuidado ao coexistirmos com os pacientes. São de facto pessoas incríveis. É impossível não nos apegarmos a qualquer um dos pacientes, há algo neles de fascinante, cada um à sua maneira. O mais deslumbrante foi mesmo o gesto que um senhor teve para comigo ao oferecer-me um dos seus desenhos, escolhido a dedo. (...)
Por fim, quero dar ênfase à importância (...) de regressar como voluntários e realçar o quanto seria do meu interesse voltar àquela Casa. Não só pela escola, como também, garantidamente, num fim de semana ou num futuro acampamento organizado pela Juventude Hospitaleira. De facto, foi uma visita marcante e cheia de recordações.»
                                                                             J.M. 12ºG

Trabalho em gesso, representando rostos.
Exposição no Museu da Casa de Saúde do Telhal
Foto de E.G.,12ºI

«Por último, participámos numa interação coletiva, numa sala com mesas redondas (o que facilitou esta interação), onde vimos em concreto a maneira como os utentes comunicam com pessoas que não residem neste espaço e também ouvir um pouco da sua história de vida antes e depois do diagnóstico ter sido feito. Apesar de termos comunicado com os residentes destas instalações ao longo de toda a visita, foi neste último espaço que tivemos um contacto mais próximo e pessoal, pelo que foi uma ótima maneira de encerrar esta experiência.
Penso que com esta visita pudemos compreender de uma maneira bastante real como a sociedade muitas vezes exclui estas pessoas, discriminando-as devido a uma doença que percebemos não ser de todo incapacitadora do contacto com os outros. As pessoas não são a doença, apenas têm o diagnóstico da mesma.»
                                                        T.G., 12ºI

quinta-feira, 23 de julho de 2020

Visita de Estudo à Casa de Saúde do Telhal (8)

A aluna M. B. F. , turma G, 12º ano, enviou-nos este texto onde dá conta, nomeadamente, da transformação que esta visita operou em si.


A visita teve início com uma palestra proferida pelo diretor de enfermagem da casa, demonstrando-se muito acessível para responder a todas as perguntas colocadas. Foi através do seu discurso que nos foram transmitidos alguns conhecimentos sobre o local onde nos encontrávamos e a forma como a equipa docente trabalha diariamente. Tomamos, assim, conhecimento que a Casa de Saúde do Telhal é o centro assistencial mais antigo de Portugal, sendo uma instituição com 126 anos que recebe homens dos 18 aos 90 anos possuidores de doenças mentais em unidades de curto, médio e longo internamento. (...)
De seguida, após um intervalo a meio da manhã para lanchar, fomos dirigidos ao museu desta ordem hospitaleira, onde pudemos tomar conhecimento do contexto histórico em que João de Deus criou esta instituição, antigos métodos e materiais utilizados como tentativa de curar certas doenças, como a terapia dos choques e os banhos gelados, e ainda inúmeras exposições com trabalhos de vários utentes. As exposições revelaram-se surpreendentes
obras de arte, um autêntico poço de criatividade e esperança que me tocou bastante. Da parte da tarde, fomos, então, divididos em vários grupos, de modo a que pudéssemos visitar os ateliês, nunca perturbando o bem-estar daqueles que habitam nesta casa, convivendo de forma harmoniosa com todos aqueles que se sentiam confortáveis com a situação.

De facto, a visita prestada aos vários locais onde os utentes convivem e trabalham diariamente foi a parte que mais me agradou de todas as atividades realizadas ao longo do dia, embora considere a palestra proferida e o museu de extrema importância, pois só assim é que teríamos o contexto necessário para poder ter a sensibilidade de contactar com pessoas iguais a nós, mas com uma
doença que, felizmente, não possuímos. A última sala que tivemos a oportunidade de visitar foi o local onde tivemos contacto direto com os utentes, conversando e jogando alguns jogos. A minha mesa era composta por três senhores, que se demonstraram muito comunicativos e brincalhões. Um deles tomou a iniciativa de jogar connosco ao jogo da forca, onde a palavra que escreveu foi “amor”, deixando-nos completamente deliciados com o seu gesto, uma transmissão de carinho que talvez simbolize falta de se sentir verdadeiramente amado. Quando o meu colega escreveu a palavra” amizade”, o utente rapidamente afirmou com um sorriso nos lábios “ nova amizade”, abraçando o Pedro, transmitindo fisicamente a palavra que anteriormente tinha escrito.
Afirmo, assim, com toda a convicção que deixei a Casa de Saúde Do Telhal de uma forma completamente diferente daquela com que entrei, não que não estivesse entusiasmada para a visitar, antes pelo contrário, mas aprendi tanto num só dia que quando sai daquele local a única ideia que me consumia a mente era voltar para aprender cada vez mais com pessoas que têm tanto prazer em partilhar as suas histórias de vida e atividades diárias com jovens como eu.
Os filmes que são projetados, assim como as histórias passadas de “boca a boca” acerca de pessoas com doenças mentais, são completamente desapropriados, deturpando a realidade, provando uma vez mais o preconceito social que existe com este tipo de utentes. São seres humanos exatamente iguais a nós, com a exceção de que sofrem um distúrbio mental que afeta o pensamento. Têm sonhos, ambições e sentem, tal como nós. E sentem toda a indiferença que lhes é dada pelos familiares que, alimentados pela violência das críticas da sociedade, acabam muitas vezes por esconder aquilo que consideram ser um problema. Não, não são um problema, são pessoas que veem o mundo de uma forma diferente, mas que devidamente medicados e acompanhados convivem pacificamente e são mais amorosos que grande parte da sociedade,
pelo menos aquela porção que os discrimina sem qualquer tipo de
conhecimento na área da psiquiatria.
É por isso mesmo que visitas como estas são tão importantes. A sociedade em geral, mas acima de tudo os jovens, tem de tomar conhecimento de outras realidades que não a sua, pois só compreendendo-as é que será um ser capaz de respeitar a diferença. Sugiro, pois, que se continue a alimentar este tipo de atividades ao longo dos anos e, se possível, até mais do que uma vez.
Seria um privilégio poder voltar um dia como voluntária, acompanhada pelos meus colegas que tanto também ainda têm a aprender. Os utentes são pessoas, não a doença mental. Cabe a nós, jovens, cumprir uma missão para o futuro, tentar mudar esta perceção que existe de pessoas que não escolheram ser assim.(...)

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Visita de Estudo à Casa de Saúde do Telhal - o que dizem os alunos (7)

A B.R, do 12º ano, Turma I, apresenta um registo da visita e acompanhou-o com fotos.


 A) Registo objetivo
No dia 30 de janeiro de 2020, algumas turmas do 12ºano da Madeira Torres realizaram uma visita de estudo à Casa de Saúde do Telhal- Ordem Hospitaleira de São João de Deus em Mem Martins, Sintra. 

Imagem 1 e 2 - Casa de Saúde do Telhal
Por volta das oito e meia saímos de escola e chegámos ao local da visita uma hora depois. A visita iniciou-se com uma palestra que serviu como uma pequena introdução para a visita ao museu e às oficinas que se iriam realizar da parte da tarde.Na palestra estavam presentes o padre Alberto (padre da igreja do Telhal), a guia do museu, Drª Carmina Montezuma, e o enfermeiro que foi quem presidiu a palestra, no entanto o Padre Alberto deixou-nos desde logo uma pequena referência sobre São João de Deus, fundador da Ordem Hospitaleira e deixou-nos uma mensagem: “Tal como o santo nós devemos ver o outro sem preconceito”. (...)  Surgiram bastantes perguntas, às quais o enfermeiro tentou responder da melhor forma. Vou destacar apenas algumas, as que considerei mais importantes e eu própria sentia a necessidade de ser esclarecida.                           
- Como se sentem os utentes ao estarem pessoas novas a visitar a Casa de Saúde? Há pessoas que se sentem bastante invadidas quando vêm pessoas novas, outras que gostam de conversar e partilhar a sua vida com pessoas diferentes, no entanto a reação depende muito da doença de cada um e claro que as pessoas são diferentes e como tal a sua maneira de reagir também o é.                                    
- Como é que o doente tem acesso a este tipo de unidade/ associação? O acesso a esta associação pode ser feito de duas formas, caso a família ou o próprio doente considere que precise deste apoio e como tal consegue obtê-lo ou por outro lado através de um hospital que encaminha o utente para este tipo de associações.   
- Existem atividades ou ateliês relacionados com animais? Já houveram atividades relacionadas com cães, em que alguns dos utentes eram tratadores de cães, ao longo dos anos essa atividade deixou de existir, no entanto há uma oficina relacionada com jardinagem.                                 
- Existem utentes com acesso a redes sociais? Sim, principalmente os utentes mais jovens. A associação inclusive dispõe de alguns computadores onde os utentes podem ter acesso á internet.                                                      
- Qual foi o episódio mais dramático que vivenciou? O enfermeiro partilhou que normalmente não existem muitos casos dramáticos, no entanto os casos que mais o chocam estão relacionados com a toxicodependência. Um dos casos que o marcou foi onde um dos utentes nem fumava substâncias aditivas mas o facto de os amigos fumarem tornou-o um fumador através do consumo passivo de drogas e fez com que a pessoa em causa desenvolvesse uma psicose. Neste momento este adolescente está então em fase de reabilitação.                                                                                        Ainda na parte da manhã passámos para a parte da visita ao museu com a Diretora do Museu que nos contou a história da Ordem Hospitaleira e de São João de Deus e ao longo da visita pudemos observar algumas das obras artísticas feitas pelos utentes.      
     Logo na primeira sala do museu onde entrámos a guia contou-nos a história de São João de Deus, descrita também num conjunto de quadros presentes na sala. (...)
 
Imagem 3 - Quadros da vida de S. João de Deus

Nas outras salas vimos as exposições de quadros, trabalhos manuais, pinturas, no fundo criações artísticas dos utentes de vários sítios do país e também alguns pertences que foram deixados para a Ordem Hospitaleira.
Imagem 4 - Projeto em video de um utente

Imagem 5 - Mãos dos utentes

Imagem 6:Pinturas de um utente dos Açores, Mestre Abreu

 Na última sala, a diretora do museu explicou-nos um pouco mais sobre a saúde mental em si e dos métodos, tratamentos e terapias utilizados antigamente para combater as perturbações mentais, na altura uma realidade pouco abordada.

De seguida fomos almoçar e da parte da tarde começámos com a parte mais prática da visita, onde estivemos contacto com pessoas que estão na Casa de Saúde e com as diferentes ocupações. (...)                                            Também conhecemos dois senhores, o P. e o C. que já lá estão há alguns anos e contaram-nos um pouco da sua história, (...) revelaram também que no início o processo de adaptação foi um pouco difícil porque era muita gente, 480 pessoas, no entanto foi muito importante para a evolução e para o bem-estar mental. Atualmente estão bastante bem e um deles disse o seguinte: ”Estou a caminho de ser um homem realizado” e sente-se orgulhoso e humilde.                                               
Na sala ao lado estavam alguns utentes a pintar numa tela e um deles, o T., era muito conversador inclusive ofereceu a alguns de nós os seus desenhos.                                                                                                       Depois fomos conhecer o ateliê de jardinagem. Neste ateliê os utentes têm um contacto maior com as plantas e a natureza e estudam essencialmente as próprias plantas que estão dentro da Casa de Saúde. Naquele dia, os utentes estavam a aprender os nomes científicos e comuns das plantas porque no dia seguinte iriam ter um pequeno teste, acompanhados também por uma professora.                                       


(...)            
Por fim, o último espaço em que estivemos foi destinado a conversar um pouco com os utentes, porém antes de entrarmos, uma das responsáveis pelo serviço teve uma pequena conversa connosco em que nos explicou que por vezes pode ser difícil para os utentes receber pessoas novas porque não estão habituados, refletimos um pouco também sobre o preconceito da saúde mental e que esta não deve ser um tabu, para além disso deu-nos alguns avisos antes de conversarmos com os pacientes, que eles por vezes têm tendência a inventar algumas situações e muitos deles não estariam tão dispostos a conversar como outros.
Quando fomos para esse último espaço, dividimo-nos em diferentes mesas onde os utentes já estavam sentados e conversámos cerca de vinte minutos, inclusive fizemos uma dinâmica para ficarmos a conhecer os nomes uns dos outros e desbloquear as barreiras para a conversa, neste espaço os utentes frequentemente jogam às cartas, pintam, fazem desenhos. Eu juntamente com duas colegas ficámos numa mesa com três senhores e inicialmente foi um pouco difícil iniciar a conversa mas depois conversámos muito. Após uma pequena conversa mas em que aprendemos bastante voltámos para o autocarro e chegámos à escola por volta das 17:30, dando assim por concluída a nossa visita.        

 B) Reflexão pessoal

         Na minha opinião e de modo geral esta visita foi bastante importante e muito interessante, permitiu-me entrar numa realidade que conhecia pouco e ter um contacto com ela.
Para mim a parte da manhã foi menos interessante do que a parte da tarde no entanto acho que foi relevante para nos contextualizarmos em relação ao que ia acontecer na parte da tarde.  O enfermeiro foi sempre bastante prestável na palestra e respondeu a tudo aquilo que lhe foi inquirido e tentou ser o mais breve e claro possível para também não ser demasiado exaustivo. Relativamente ao museu considerei as obras e trabalhos realizados pelos utentes bastante interessantes, pudemos observar as suas criações e perceber através da arte como a cabeça deles funciona, existem pessoas mesmo talentosas e criativas apesar das possíveis barreiras da sua doença. Para além disso também achei interessante a história de São João de Deus e como fundador desta Ordem Hospitaleira é impossível não contar a sua história, no entanto acho que a visita se baseou mais na história do museu e não tanto sobre a área da psicologia em si e da saúde mental o que acabaria por ser mais interessante para nós. Para além disso tivemos pouco tempo para observar o museu.                                           
Como já referi anteriormente, a parte da tarde foi muito mais interessante não só pelo contacto com os utentes mas também porque pudemos perceber melhor aquilo que o enfermeiro tinha referido de manhã e também conhecemos as diferentes oficinas/ateliês.
Gostei bastante do relato daqueles dois senhores na área de dia, fez-me perceber que a doença mental não é um entrave para nada e que pode ser ultrapassada com força de vontade e o apoio certo, aqueles dois senhores são a verdadeira prova disso e eles mesmo o reconheceram.                                           
Quanto aos ateliês, reconheci que são atividades importantes para aquelas pessoas, pois têm uma ocupação e acredito que as faça sentir melhor.               
Sem dúvida que o meu momento favorito foi a conversa no final e fiquei bastante comovida, eu e duas colegas fomos para a mesa de três senhores dos quais dois conversavam bastante e outro era mais idoso e já não ouvia muito bem. Sinceramente não me recordo dos nomes desses dois senhores conversadores mas a conversa que estavam a ter connosco comoveu-me imenso porque eles tinham a perfeita noção que estavam ali e pouco podiam fazer em relação a isso. Um deles estava a dizer-nos para vivermos a vida porque eles lá dentro não a podiam aproveitar e o outro completou-o e disse: “A verdade é que nós não somos importantes”. Tanto eu como as minhas colegas não soubemos o que dizer mas foi sem dúvida uma conversa que nunca me vou esquecer.                                                                         
Esta visita de estudo foi uma constante aprendizagem e acho que se encaixou perfeitamente no programa da disciplina. Pelo que pude observar, esta Casa de Saúde oferece excelentes condições aos seus utentes e muitas atividades e isso pode ser uma mais-valia para o desenvolvimento daquelas pessoas, gostei bastante de visitar e sem dúvida que voltaria lá para ficar ainda mais esclarecida e ter mais tempo para visitar.