segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Universalidade e particularismos na Religião

                      À partida, é imperioso considerar que qualquer religião, mais ou menos numerosa, mais ou menos organizada, parte dos particularismos e idiossincrasias de onde nasceu (é a Historicidade, que também afeta a própria Filosofia).

          Entende-se como religião, a complexidade, organizada e ordenada, de crenças, ritos, espaços e tempos sagrados, ensinamentos e narrativas, que se referem ao Transcendente, que nas religiões é entendido como fundante e anterior ao Tempo. Faz parte também do fenómeno religioso o conjunto de normas para a existência quotidiana que possibilitem a harmonização com o poder transcendente e com a sua ordem fundante e fundadora. Por este motivo qualquer religião tende a apresentar-se como ‘A Narrativa’ (exclusiva e verdadeira) dos acontecimentos primordiais, a explicação para os acontecimentos presentes e a possibilidade de antecipação dos tempos futuros, assim como oferecer o sentido primeiro e último para a Existência.

          No entanto, porque o mundo se foi transformando num lugar pequeno e fomos cada vez mais podendo comparar as diversas narrativas religiosas, situando-as no espaço e no tempo, podemos verificar que as referidas narrativas, que revelam e permitem a relação com a transcendência, decorrem (decalcam, até) as circunstâncias existenciais, concretas, do povo onde elas nasceram, que nelas acredita e as revela. Por exemplo: para os povos semitas (judaísmo, islamismo), rodeados pelo deserto, que se apresenta sempre inconstante na sua aparência, o Transcendente não pode manifestar-se nunca ao olhar e marca-se com mandamentos severos essa impossibilidade relativa à representação da Transcendência (proibição absoluta da representação de realidades transcendentes) - a experiência do deserto mostra que o olhar está sujeito às miragens e que o território é volátil devido aos ventos que o alteram constantemente; pelo contrário, o subcontinente indiano é rico na sua variedade geográfica, fauna, flora… aí os sentidos são inundados constante e prazenteiramente e é assim que vemos nas religiões da India (no Sanatana Dharma), a valorização dos sentidos e a crença de que estes podem (não só, mas também) conduzir à Transcendência - torna-se muito natural que até tenham um conceito para isso: darshan (ver Deus).


Prof. Carlos Reis

 2/12/2021

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