domingo, 11 de dezembro de 2016

Dia Mundial da Filosofia, 2016, a palavra dada aos alunos (7)

“Deve a União Europeia receber refugiados sírios?”

Na atualidade, a migração de refugiados sírios que fogem de conflitos armados para a Europa, tem feito manchetes em todo o mundo e dividido milhares de opiniões quando se coloca a questão: “Deve a União Europeia receber refugiados sírios?”.
É impossível ficar indiferente a este drama humanitário, quer queiramos quer não, as redes sociais e os mais diversos meios de comunicação social fazem questão de partilhar o desespero e aflição destas pessoas que atravessam frequentemente uma série de obstáculos.
 A verdade é que existem muitos europeus com receio da vinda dos refugiados. Muitos tendem a considera-los terroristas que se estão a aproveitar das circunstâncias para entrar neste continente, o que na minha perspetiva é completamente incompreensível. Estas pessoas viram-se obrigadas a abandonar o seu país onde a extrema violência se tornou praticamente diária, um país onde uma minoria leva a ideologia religiosa ao extremo sem pensar nas consequências e ignorando os inocentes.
Pois também é verdade que existem dois fatores em constante contradição: o facto da  guerra na Síria se agravar cada vez mais e o facto dos europeus se encontrarem divididos no que toca à receção destas pessoas. Pois vos digo eu, que a solidariedade não deve ser um “presente” para os refugiados mas sim um dever legal da União Europeia. Partindo do ponto de vista de Nelson Mandela, que afirmou sonhar “com o dia em que todos se levantarão e compreenderão que fomos feitos para viver como irmãos” concluiu-se que a entreajuda e a solidariedade devem ser deveres de todos nós. Alias para uma União Europeia que defende valores morais como a dignidade humana, a igualdade e o respeito dos direitos humanos (incluindo os direitos de pessoas pertencentes a minorias), esta deve ser a primeira a agir e tentar trabalhar de modo a que estas pessoas deixem de viver em condições desumanas (como atualmente estão submetidas).

Enfim, como todos sabemos é nosso dever agir de acordo com aquilo que defendemos, por isso a necessidade de agir de modo a ajudar estas pessoas é urgente. Afinal nunca é tarde demais para mudar o rumo da história.

Joana Bezerra, 11ºB

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Ainda a Palestra do Professor Bagão Félix

Coube ao aluno Rui M. realizar o relatório da aula do dia 17 de novembro. Como a aula coincidiu com a palestra, aqui temos o seu relatório:

«A palestra iniciou-se com a habitual apresentação da biografia do professor e economista Bagão Félix.
Este começou por nos apresentar o tema, explicando a origem etimológica da palavra ética e dizendo que esta foi inventada por Aristóteles, derivando da palavra grega ethos.
 Em seguida abordou os sete pecados sociais, de Mahatma Gandhi, que são os seguintes: política sem princípios, riqueza sem trabalho, prazer sem consciência, conhecimento sem caráter, comércio sem moralidade, ciência sem humanidade e culto sem sacrifício.
 Este explicou que estes pecados a que Gandhi se refere acontecem devido ao facto da nossa sociedade ser individualista e apenas pensar no seu próprio bem e do lucro que estes podem obter através destes comportamentos.
 Após esta breve abordagem, o professor passou a falar sobre a relação entre a ética e a lei. A ética é base de inspiração para as normas jurídicas sendo que nem todas as normas jurídicas se baseiam na ética e nem todas as ações eticamente erradas são punidas por lei. Os exemplos utilizados foram: o tamanho do cartão de cidadão e copiar nos exames, respetivamente.
 Para dar continuidade à palestra foi-nos feita uma pergunta retórica que foi a seguinte: O que é ser indivíduo? Passando-nos a explicar que ser indivíduo é ser único e irrepetível apenas de um ponto de vista biológico, não nos dando direito a acharmos que somos superiores a outros seres.
 Seguindo o tema, explicou que o cidadão possui direitos e deveres, presentes nas leis, sendo originalmente um termo proveniente da Grécia, mais especificamente da polis, ou seja, da cidade.
 Em seguida foi introduzido um terceiro tema: O que é ser pessoa? que consiste em ter vontade, perceção, sensibilidade e consciência das nossas ações.
 Isto serviu para introduzir o seguinte tópico, que nos diz que nenhuma lei proíbe o ódio, maldade, ganância, mentira,...
 As leis são apenas uma pequena porção (de adesão obrigatória) da ética, que se aproximam dela mas nunca a atingem na sua totalidade.
 Sendo assim, podemos concluir que a pessoa tem mais deveres que o cidadão, pois o cidadão tem de cumprir a lei, mas a pessoa além de leis, também tem o dever de seguir aquilo que a ética aceita como correto.
 Assim sendo percebemos que as leis distinguem o que é legal do que é ilegal, já a ética distingue o que é legítimo do que é ilegítimo.
 Em seguimento é-nos apresentado algo novo que consiste na aritmética da ética, que nos diz que a ética é a combinação dos saberes e dos valores.
 O professor aconselhou a leitura do livro de Aristóteles, intitulado Ética a Nicómaco, que, mesmo tendo sido escrito há 2500 anos, levanta questões éticas presentes na sociedade de hoje em dia.
 Foi utilizada então a expressão decência, que é considerada pelo autor uma expressão em desuso, que se refere à estética da ética e que implica que o nosso comportamento se baseie nos valores.
 Outra expressão que o professor também destacou foi integridade, que consiste na combinação de integral com responsabilidade.
 Posto isto, foi assim abordado algo novo para mim a que o professor chamou orgulho de pertença, que é a falta de orgulho naquilo que possuímos, como a nossa escola, casa, etc. O caso que mais o choca é a falta de utilização da palavra Portugal, e o facto da população portuguesa, na sua maioridade, apenas mostrar orgulho no seu país quando se fala em futebol.
 Retomando a abordagem dos direitos e deveres, foi levantado o caso de desarmonia que por vezes é notório entre estes, tendo um impacto enorme na nossa sociedade, o que leva à revolta e insatisfação.
 Foram utilizados alguns exemplos como:
o direito à vida implica não atentar contra a mesma, o direito à verdade implica não mentir, o direito ao trabalho implica trabalhar.
 Por estas mesmas razões devemos optar por merecer os nossos direitos através do cumprimento dos nossos deveres e não através de facilitismos, contornando obstáculos em vez de os ultrapassar.
 Em seguida passámos a falar sobre os saberes. Os exemplos foram: o conhecimento, diretamente ligado ao lado cognitivo, o saber mudar que é a adaptação, o saber comandar que é a liderança, o saber rir que é o humor e o saber entender que é a compreensão. Após ficarmos mais esclarecidos sobre no que é que os saberes consistem, o professor referiu que nem sempre podemos aprender tudo através do saber cognitivo mas que temos também de nos envolver e de experimentar através da compreensão. Aconselhou-nos também que, quando nos envolvemos não nos devemos comprometer, dando o exemplo do fiambre e do ovo. Quando comemos um ovo a galinha esteve envolvida, pois é ela quem o põe, mas quando comemos fiambre o porco está comprometido pois este teve de falecer para o podermos comer.
 Este concluiu que a ética é uma combinação de conhecimento, sabedoria e experiência.
 Em seguida o professor dividiu a ética em exemplo, erro e exigência.
Em relação ao exemplo este apresentou-nos uma citação, que é a seguinte: longo é o caminho através de regras e normas, curto e eficaz através de exemplos.
Já cometer erros é um privilégio, que vai de encontro ao referido acima, e que nos diz que devemos experimentar e não nos devemos restringir ao saber cognitivo.
Por fim, na exigência, este distingue a pessoa comum, que é exigente com os outros exclusivamente, da pessoa superior, que é exigente consigo própria.
 Dando continuidade foi abordado um tema relativo à gestão de tempo. Foi-nos dito que em primeiro lugar devemos dar atenção ao que é importante e urgente, deixando para último o que não possui importância ou urgência.
Quando nos é apresentada uma situação urgente, mas não importante, e uma importante, mas não urgente devemos resolve-las pela ordem apresentada.
Todavia, o homem é o único ser que possui noção de importância, pois os animais apenas sabem o que é urgente, nomeadamente as suas necessidades biológicas como, por exemplo, comer.
 Avançámos assim para os graus éticos. Estes dividem-se em três: ética requerida (segredo profissional), ética permitida (silêncio de um arguido) e ética proibida (matar uma pessoa).Ambos os exemplos dados para a ética requerida e permitida, podem tornar-se em ética proibida se estes possuírem informações sobre um crime. Já o exemplo dado na ética proibida pode ser permitido quando em legítima defesa.
 O subtema abordado em seguida foi a globalização (progressiva erosão da relevância da noção de distância e de tempo para as atividades, relações e processos políticos, económicos e sociais), levando assim a uma vulgarização do mal. O professor deu-nos a compreender, através de exemplos divertidos, que hoje em dia, mais e mais convivemos com objetos e produtos das mais variadas zonas do mundo.
Como consequência da globalização, tudo se tende a igualar, menos as pessoas.
Em continuidade este dividiu as pessoas em quatro tipos:
Os inteligentes, em que ambos, ele e outrem, lucram.
Os generosos, em que apenas outrem lucra.
Os malfeitores, que ganham através da perda de outrem,
E os estúpidos, em que não existe lucro algum, chamando assim, àquele que perde mais que outrem, um estúpido mais que perfeito.
 Continuando a palestra, este abordou de forma superficial o imperativo categórico de Kant, que nos diz para agir da forma que queremos que todos ajam, de forma a essas ações se tornarem máximas.
Assim sendo os deveres dividem-se em dois tipos:
O dever legal, não tendo grande importância ética, mas sim devido a uma obrigação legal.
O dever moral, este sim com relevância ética, pois a ação é baseada na consciência.
 Passámos então a ouvir um novo tópico, o todo e as partes.
Aqui o professor falou-nos sobre individualismo, afirmando que deveríamos funcionar como uma orquestra: todos têm a mesma partitura, existe pouca hierarquia, e todos são cruciais.
Tal como o Papa Francisco disse: Poliedro, a união de todas as partes, que, na unidade, mantêm a originalidade das partes individuais.
Ainda relativo ao tema, o professor contou-nos a história da visita do rei Luís IX de França à catedral de Chartres. De forma resumida, nesta história o rei visita a catedral, que estava a ser construída, perguntando a cada pessoa que lá trabalhava o que estava a fazer. O carpinteiro dizia que estava a tratar da madeira, o escultor a esculpir, etc. Por fim, já à saída, vê um homem baixo e corcunda, já idoso a varrer o chão, e fazendo a mesma pergunta este responde: Estou a construir uma catedral!

Sendo assim podemos concluir que todos são importantes independentemente da posição que ocupam, ou seja, não deve existir individualização pois todos lutam para um objetivo comum. No final da palestra apenas duas dúvidas foram colocadas (referidas na participação oral) e após o seu esclarecimento, foram feitos os habituais agradecimentos, sobretudo ao professor Bagão Félix. Após o vereador e a vice-presidente darem a sua apreciação sobre a palestra, abandonámos o auditório dando a lição por terminada.

Ainda a Palestra do Professor Bagão Félix

A (in)sustentável urgência da ética
      Foi este afinal o título da comunicação a que assistimos no passado dia 17 de novembro, na qual o Professor Bagão Félix defendeu a tese de que a crise pela qual estamos a passar «mais do que económica é uma crise ética». Podemos considerar que esta tese fornece  uma  resposta para entender o que sucedeu nos Estados Unidos da América e na Europa com o colapso do sistema financeiro e bancário, em 2008, que conduziu a uma crise global com consequências económicas e sociais enormes, nomeadamente a nível do aumento das taxas de desemprego e da pobreza.
     A tese defendida por Bagão Félix parece aproximar-se da de todos aqueles que defendem que a  ausência de princípios morais e a ganância esteviveram na origem da crise. Como consequência, a solução deverá ser encontrada na ética, o que de forma muito coerente foi sustentado pelo palestrante.
    A propósito deste problema dos nossos dias, diz o  filósofo norte americano M. Sandel:
    «Há quem afirme que a ausência de princípios morais no âmago do triunfalismo do mercado se deveu à ganância, que por sua vez levou a uma irresponsável propensão para assumir riscos. A solução segundo esta visão consiste em refrear a ganância, insistir numa maior integridade e responsabilidade dos banqueiros dos executivos de Wall Street e decretar regulações sensatas, de modo a evitar que volte a ocorrer uma crise semelhante.» (M. Sandel, 2015, O que o dinheiro não pode comprar, Presença, Lisboa) Pode-se objetar, como faz M. Sandel, que se trata de uma visão parcelar e apresentar outra resposta, que é precisamente o este filósofo faz. 
        O facto de um problema possibilitar vários tipos de respostas, quer para o seu entendimento quer para a sua solução, permite que nos demos conta da sua complexidade e convida-nos a um exercício ativo do nosso pensamento de uma forma autónoma e crítica. 

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Para lá do discurso de Trump

A revista francesa Philosophie Magazine, no seu número de novembro, inclui uma entrevista com Moisés Naím, apresentado como «um dos intelectuais mais influentes dos Estados Unidos». A entrevista aborda o seu último livro intitulado The End of Power e, naturalmente, a questão mais atual da política americana -  a campanha para as eleições presidenciais.
Transcrevo uma parte da sua entrevista que nos pode ajudar a interpretar o discurso de Trump e a sua recetividade junto de largas camadas da população americana, a ponto de a ter convencido a votar nele para presidente dos Estados Unidos da América e de o sistema eleitoral americano o ter feito eleger.

« (...) Toda a gente sente que há mudanças sísmicas, a todos os níveis. E a maior parte das pessoas não sabem se estas mudanças lhes vão ser favoráveis. Para um grande número, essencialmente nos países desenvolvidos, estas mudanças não foram benéficas. Elas veem-nas, então, como ameaças. E querem que alguém páre isso, que elimine a incerteza. Trump promete a segurança. Ele prometeu, por exemplo, que se fosse eleito, acabaria com o terorismo. Isso não tem nenhum sentido. Ninguém tem a fórmula mágica. E no entanto esta promessa acertou no alvo. Trump não faz promessas excessivas. Faz promessas que toda a gente sabe que não funcionam. O seu programa está cheio de ideias mortas. Nós sabemos que os muros não impedem os migrantes.Isso não o impede de ter feito da construção de um muro entre os Estados Unidos e o México o eixo central da sua política de imigração. Na realidade, a exequibilidade desta medida não lhe interessa. Trump evolui num regime de "verdade" que o torna hermético à crítica.

      Fala-se muito neste momento da post-truth politics, de uma política " para além da verdade". Trump é o rosto desta nova política?
Ele introduziu um novo modo, muito eficaz, de se comportar em relação aos factos, que consiste em injetar na política, à vista de toda a gente, mentiras. Trump mente sempre. Isso está estabelecido e documentado. Mas isso não muda grande coisa. Os eleitores têm afetos e a principal função das mentiras de Trump é dar expressão a estes afetos. Assim, eles não se preocupam com o facto de serem mentiras. Houve, durante esta campanha, todo um trabalho de fact-checking, de "verificação de factos" por parte da imprensa e mesmo dos cidadãos comuns. É importante que este trabalho seja feito. Mas isso não afeta propriamente Trump. Vimos a mesma coisa com os partidários do Brexit que avançaram números totalmente erróneos sobre as consequências da saída da Grã-Bretanha da União Europeia. Reconheceram-no no dia a seguir ao referendo. Sem que isso tenha chocado excessivamente os eleitores. Estes números têm a função de exprimir a sua ansiedade, eles querem acreditar neles, mesmo que sejam falsos. Estamos portanto na era da política pós factual.

    Trump tem alguma chance de ganhar?
As sondagens indicam que é um verdadeiro competidor e que tudo pode acontecer. (...)»

Naím, Moisés (2016), Entrevista a Martin Legros, Philosophie Magazine, nº 104, pp. 70-75.