quinta-feira, 22 de junho de 2023

Debate Eutanásia (7) - O problema moral, alguns esclarecimentos para um debate

Do grego eu, que significa bem e thanatos, que significa morte, a palavra eutanásia significa “boa morte” ou “morte feliz” porque é uma “morte feliz” para quem morre, ou seja, é uma morte benéfica para o paciente. Daqui podemos inferir que a eutanásia consiste em provocar, intencionalmente, a morte de um determinado indivíduo para seu benefício. Porém, importa salientar que a forma como a morte do paciente é provocada pode ser efetivada de duas maneiras diferentes: tomando medidas ativas ou passivas. No primeiro caso, estamos a falar de eutanásia ativa porque são tomadas medidas ativas – como, por exemplo, uma injeção letal – que matam o paciente. Por outro lado, no segundo caso, estamos a falar de eutanásia passiva porque são tomadas medidas passivas - como, por exemplo, a omissão do uso do suporte de vida do paciente - com a finalidade de o deixar morrer. Tal como podemos sintetizar através das palavras de Pedro Galvão:

“Outra distinção entre tipos de eutanásia, independentemente daquela que respeita à vontade do paciente, é a que separa a eutanásia ativa da passiva. Na primeira, a morte ocorre em virtude de algo que o agente faz: ele mata o paciente. Na segunda, o agente limita-se a deixar morrer: a morte do paciente resulta de uma simples omissão.” (Galvão 2015: 49).

Reconhecendo, por um lado, que o problema ético da eutanásia não se esgota nesta distinção e, por outro lado, de forma a esclarecer conceitos essenciais que estarão na base do debate a realizar, urge a necessidade de compreendermos os diversos tipos de eutanásia: eutanásia voluntária ativa; eutanásia involuntária ativa; eutanásia não voluntária ativa; eutanásia voluntária passiva; eutanásia involuntária passiva; eutanásia não-voluntária passiva. Comecemos por salientar a principal diferença:

“(...) a eutanásia voluntária: aquela que é praticada a pedido do paciente ou, se ele já não for capaz de exprimir a sua vontade, de acordo com as instruções que deixou quando era competente para decidir o curso da sua vida.” (Ibidem)

Do grego voluntas, que significa vontade, o adjetivo voluntário qualifica algo que é realizado de livre vontade e, como tal, a eutanásia voluntária verifica-se quando o paciente está em sofrimento e pede, voluntariamente, que o “matem” (eutanásia voluntária ativa) ou que o “deixem morrer” (eutanásia voluntária passiva). Inversamente, temos a considerar a:

“eutanásia não-voluntária, que se aplica àqueles que, sem terem deixado instruções relevantes, perderam a capacidade de entender a escolha entre a vida e a morte – ou que, como no caso dos recém-nascidos, nunca chegaram a ter essa capacidade.” (Ibidem).

Assim, a eutanásia não-voluntária consiste em “matar” (eutanásia não-voluntária ativa) ou “deixar morrer” (eutanásia não-voluntária passiva) um determinado paciente que não está em condições de expressar a sua vontade, nem de efetivar o seu consentimento devido ao facto, por exemplo, de estar em coma. Relativamente à eutanásia involuntária “(...) o paciente é capaz de entender a escolha entre a vida e a morte, mas é morto contra a sua vontade ou sem lhe ter sido dada a oportunidade de a exprimir.” (Ibidem). Neste caso, podemos afirmar que esta consiste em “matar” (eutanásia involuntária ativa) ou “deixar morrer” (eutanásia involuntária passiva) um determinado paciente contra a sua vontade, no sentido em que este estava em condições de dar ou recusar o seu consentimento, no entanto, não lhe foi dada a oportunidade de o expressar. Optámos por estabelecer a distinção entre os vários tipos de eutanásia porque, antes de partirmos para o debate sobre o problema fundamental, é preciso que estejamos familiarizados não só com os conceitos básicos que lhe estão associados, mas também com os valores que a prática da eutanásia poderá colocar em causa.

A questão-chave em torno da qual girará o debate é a seguinte: «Será a eutanásia voluntária moralmente permissível?» Iremos, portanto, refletir sobre a eutanásia voluntária, isto é, a eutanásia que é praticada a pedido dos pacientes, especificamente os que sofrem de doenças terminais ou que estão num estado permanente de dor e sofrimento irremediável, e que querem por termo à vida para o seu próprio bem.

Neste contexto, levantámos algumas questões-problema orientadoras da discussão: “Será moralmente permissível que os indivíduos, especificamente os doentes terminais com dores físicas e sofrimento emocional insuportáveis, acabem com as suas vidas?”; “Se sim, será aceitável que o façam recusando, apenas, o tratamento médico que sustenta as suas vidas ou tomando medidas ativas para se matarem?”; “Se for permissível tomarem medidas ativas para se matarem, será moralmente aceitável pedirem a outros – por exemplo, aos médicos – para os auxiliarem na concretização dessa ação?”; “Será moralmente aceitável aceder a esse pedido?”

(Texto e atividade sob responsabilidade da professora Lúcia Silva)

Pedro Galvão, Ética com Razões, Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2015


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