A decisão da Assembleia da República baseia-se em princípios filosófico-jurídicos que privilegiam o valor da liberdade individual em detrimento de outros. A existência de uma lei que torna legal a eutanásia não interfere na esfera privada onde são tomadas as decisões individuais. A lei permite, mas não obriga.
Que esta questão não tem nada de simples, sabemo-lo. E sabemos também que da teoria à prática vai um longo caminho.
Porque nos pareceu útil para enquadramento deste problema, transcrevemos do dossier "Eutanásia e Suicídio Assistido" publicado no site do Parlamento (60-04-2022.pdf (parlamento.pt).
«A abordagem dos assuntos tratados, baseando-se em legislação e noutra documentação técnica, é fundamentalmente
jurídica, como não poderia deixar de ser, e o objeto do estudo é delimitado pelas condutas da eutanásia ativa e do
suicídio assistido.
Trata-se de temas muito controversos e delicados. O sentido com que as legislações se orientam é fortemente
influenciado por diversos fatores de ordem social, religiosa, histórica, ética, moral, filosófica e até, por muito que nos
choque, eugénica e meramente económica.
A favor da eutanásia estão os que acreditam no seu significado como caminho para evitar a dor e o sofrimento de
pessoas em fase terminal ou sem qualidade de vida, um caminho consciente que reflete uma escolha informada.
Realçam a defesa da autonomia absoluta de cada indivíduo, do direito à autodeterminação, do direito à escolha pela
sua vida e pelo momento da morte e da prevalência do interesse individual acima do da sociedade, com primazia da
proteção da vida. A eutanásia não defende a morte, mas a escolha da morte por quem a concebe como a melhor opção.
Por isso, a escolha da morte não pode ser irrefletida. As componentes biológicas, sociais, culturais, económicas e
psíquicas têm de ser avaliadas, contextualizadas e pensadas, de forma a assegurar a verdadeira autonomia do indivíduo
que, alheio a influências exteriores à sua vontade, certifique a impossibilidade de arrependimento.
Contra a eutanásia são esgrimidas razões de natureza religiosa, ética, política e social. Designadamente na ótica
religiosa, a eutanásia é vista como usurpação do direito à vida humana, que só a Deus pertence. Na perspetiva da ética
médica, há quem realce o dever de acatar o juramento de Hipócrates, que vincula os profissionais de saúde ao respeito
pela vida do paciente. »
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