quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Dia Internacional da Filosofia (5) - Da importância das perguntas e do rigor dos conceitos - Da diferença entre "generosidade" e "solidariedade"



As perguntas orientam-nos acerca daquilo que queremos saber. Iluminam o horizonte. Mas só os conceitos nos dão o rigor e a precisão que permitem distinguir os objetos.


Como é que este texto nos pode fornecer instrumentos conceptuais para debater e ser capaz de pensar melhor?

      Ser solidário é defender os interesses do outro, certo, mas porque eles são também - diretamente ou indiretamente - os meus. Agindo para ele, eu ajo também para mim: porque temos os mesmos inimigos ou os mesmos interesses, porque estamos expostos aos mesmos perigos ou aos mesmos ataques. Assim o sindicalismo, a segurança ou a fiscalidade. Quem se julgaria generoso por estar bem seguro, por estar sindicalizado ou por pagar os seus impostos? É que a generosidade, é outra coisa: é defender os interesses dos outros, mas não porque eles são também os meus; é defendê-los mesmo quando não os partilho(...). Agindo para ele, não ajo para mim: não está excluída a possibilidade de eu perder alguma coisa, é mesmo o mais frequente. Como guardar aquilo que se dá? Como dar o que se guarda? Isso não seria dom, mas troca: já não seria generosidade mas solidariedade.
       A solidariedade é um modo de defesa de vários; a generosidade, no limite, uma maneira de se sacrificar a si, pelos outros.  É por isso que a generosidade, moralmente, é superior; é por isso que a solidariedade, socialmente, politicamente, é mais urgente, mais realista, mais eficaz. Ninguém se quotiza na Segurança Social por generosidade. Ninguém paga os seus impostos por generosidade. (...)  
     (...) Ninguém respeita a lei por generosidade. Ninguém é cidadão por generosidade. Mas o direito e o Estado fizeram mais pela justiça ou a liberdade, do que os bons sentimentos.  
         Solidariedade e generosidade não são, no entanto, incompatíveis: ser generoso não impede ser solidário; ser solidário não impede ser generoso. Mas elas não são também equivalentes, e é por isso que nenhuma delas é suficiente nem pode substituir a outra.(...)
       Generosidade: virtude moral. Solidariedade: virtude política. A grande tarefa do Estado é a regulação e a socialização dos egoísmos. É por isso que ele é necessário. É por isso que ele é insubstituível. A política (...) é o reino das relações de força e das opiniões, dos interesses e dos conflitos de interesses.
                                   Comte- Sponville, Présentations de la philosophie, Paris, Albin Michel, 2000                                                                                                         (tradução da nossa responsabilidade)

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